MINHA HISTÓRIA DE MENINO (Se eu pudesse voltar)
Se fosse algo possível, certamente ao passado eu voltaria,
Lá eu seria bem recebido, quiçá com muita honraria.
Eu ia correr pelas ruas, sem camisa e sem cansaço,
Numa tremenda alegria, desfrutando de todo aquele espaço.
Primeiro eu abraçava meus pais, que há tempos eu não via,
Depois meus irmãos e meus avós, que felicidade meu Deus, que alegria!
Eu ia rever meus amigos, de um jeito bem diferente,
Até meus inimigos, acreditem, me deixariam contente,
Era tanta coisa pra sentir, tanta coisa pra olhar,
Tanta coisa pra dizer, que seria difícil calar.
Que seria difícil a tristeza,
Encontrar um lugar pra ficar.
Começaria pela casa que eu morava,
Uma vila bem modesta, bem pertinho do cemitério,
Em frente do Patronato, que pra mim era um mistério.
A feira ficava do lado, o açougue ficava pertim,
Domingo eu cortava o cabelo, num barbeiro de nome Benjamim.
Se o carro da figurinha passasse, eu metia o pé na carreira atrás,
E se eu visse uma arraia bolando, ai é que eu corria mais,
Eu jogaria de bila, de bola, de bata, de triângulo,
De carteira, de pião, de pedra e de balangotengo.
Ficaria o dia todo soltando arraia, com o sol quente rachando meu quengo!
No domingo eu estaria na igreja,
Sentado nos batentes de sua calçada,
Vendo aquelas meninas passando,
Sozinhas ou em revoada,
Certamente a alegria faria,
Do meu mundo de sonho sua morada.
Na semana bem “cedim”, eu acordava e tomava café
E me tacava pra escola, “nera” de carro não era a pé...
Eu saia bem arrumadinho, com os cadernos pela mão,
O bolso quase sem dinheiro, talvez uns poucos tostão.
Sairia correndo pela base velha até chegar no grupo,
Quando de frente eu estivesse ,talvez eu ficasse maluco,
Talvez a alegria parasse meu peito, ou talvez eu parasse de andar.
Paralisado eu ficaria, só querendo admirar!
Eu admiraria cada grito, cada carreira desenfreada,
Cada assobio, cada queda e cada rodada.
Quando a sineta tocasse, meu coração estremeceria.
Soaria como uma música, que do chão me arrastaria, meu camarada.
Dai eu tomaria meu lugar na fila,
me posicionando prá na sala entrar,
Depois apertava meu peito, na hora do hino cantar,
e cantava com todo respeito, pois aqui meu pai, aqui é meu lugar!
Ao chegar dentro da sala, naquela fila desajeitada,
Sentava numa carteira junto com um camarada,
E enquanto a professora não vinha,
Eu curtiria a minha turma fazendo aquela zoada.
Quando ela entrasse na sala e mudasse a situação,
Todo mundo calava, num respeito total,
Daí ela mandava sentar, e só assim começava,
Seu ofício de ensinar, que era fenomenal!
O recreio logo batia, daí todo mundo corria,
Como se fosse a última vez,
Como se fosse uma rês, num pasto a se deleitar,
Como se fosse um pássaro, liberto duma gaiola,
Como se fosse um som, despencando duma vitrola.
Eu sairia correndo pra brincar de pega-pega,
Pra brincar de bola, pra brincar de cabra cega,
Pra andar em cima do muro e pra brincar de arêia,
Não me importava com a vida alheia,
Eu só queria era me esbaldar.
Do dinheirinho que era pouco,
Eu comeria uma tapioca de coco, vendida no portão do Grupo.
Ou talvez uma cocada com um bombom Azedim.
Isso foi uma grande felicidade,
Que só agora pude interpretar assim.
E eu tentaria aproveitar cada momento, usando bem mais meu sentimento, sem perder nem um “tiquim”.
Nas tertúlias eu fui feliz de fato,
No João César e no Patronato muita coisa boa aconteceu,
E somente quem viveu, pode entender o que digo,
Pode dizer que o perigo, por lá nunca apareceu.
Que a alegria era fartura, que a amizade era sincera,
Que amar era uma quimera, em meio a tanta jura.