Onde eu nunca estive antes
De vez em quando eu desembesto a pegar um ônibus e ir para pontos da cidade onde eu nunca estive antes. Normalmente é pra visitar alguma atração turística que eu conhecia apenas de ouvir falar. Mas até chegar lá costumo me perder um bocado – a realidade é muito mais complexa do que os mapas. Às vezes estendo as minhas explorações para a região metropolitana e os resultados são idênticos. Em São José dos Pinhais desci no terminal errado e ainda precisei penar muito até descobrir o rumo certo. Mas não deixa de ser um jeito divertido de conhecer uma cidade. E naquele dia eu não queria visitar nenhuma atração turística: queria apenas remexer alguns papéis velhos.
Aconteceu que há 150 anos um casal de não-sei-quanto-avós havia se casado justamente em São José dos Pinhais. Como sou um desses sujeitos que não deixa os mortos descansarem em paz, decidi visitar a cidade e procurar por aquele registro de casamento. A muito custo descobri a secretaria paroquial da cidade e pedi pelos livros amarelados. Vesti um par de luvas descartáveis, já sabendo que apenas os ácaros se interessam pelo passado mais do que eu. E lá fiquei folheando, em profunda meditação, mal reparando nas pessoas que entravam para oferecer missas ou acertar o dízimo.
Mas há muito mais malucos pelo mundo do que se imagina, e por isso não foi de se admirar que logo aparecesse outra pessoa querendo consultar registros antigos. Trocamos olhares de mútua compreensão enquanto ele se sentava próximo a mim e então ficamos em absoluto silêncio, debruçados sobre os livros e atentos aos garranchos escritos por um padre esquecido há muito tempo. Não demorou até que eu batesse os olhos e visse o nome do casal que procurava. Fiquei emocionado mas me contive. E enquanto eu lia aquele registro era como se os dois estivessem se casando de novo na minha frente. Ali estavam eles em São José dos Pinhais, e eu os observava já consciente de que aquela não era a minha primeira vez na cidade.