Milagre Natalino
Chovia cor verde-água. Chuva fina, preguiçosa... Quase garoa. Tão granulada – gotas não – que o guarda-chuva pouca serventia tinha: os grânulos entravam por baixo dançando no ritmo da brisa fria e molhava as roupas.
As pessoas não se importavam se molhariam: multidão se fazia andando. A ânsia de consumir, comprar, endividar era maior. Aquele impulso era maior que o espírito do festejo: nasceu Jesus na manjedoura em Belém. O capitalismo deste tempo, maior que a humildade daquele, cegava a todos, até a anciã.
Foi quando o ir e o vir na calçada foi estagnado. Todos pararam para ver o pequeno pássaro cor água-azul. Parecia que as gotículas do chuvisco se concentraram e milagrosamente se transformaram em ser vivo alado.
O milagre mesmo fora fazer as pessoas saírem de seu transe e observarem. Por um momento tornaram-se livres do consumismo: pararam para ver o alado voar, livre.
Admiraram-se pela beleza, pela cena, pelo inédito. Formaram-se espectadores e não meros transeuntes mais.
Ao limpar a gaiola dos periquitos multicoloridos aquele escapara aproveitando o descuido do proprietário. Destinava-se, o pássaro, a fazer o milagre que a data – nascimento do messias – requeria: fazer o humano se libertar de seus atos impensados.
Missão cumprida: as pessoas, ainda que por instantes, deixaram de seguir o impulso para ver que o simples impressiona mais que o espetaculoso que cega.
O periquito também liberto agora aprendia a voar. Nascera para isto: voar e ser livre. Voava aqui, voava ali e, já praticado o ensaio, voou para o céu.
E foi assim que aquele que andara sobre as águas, parou os homens de seus frenesis compulsivos – comprar, comprar – e os presenteou com mais esta cena e ao pássaro cor de água-esperança com a subida aos céus – voar, voar.
Foi o milagre de Jesus neste Natal.
Leonardo Lisbôa.
Barbacena, 27/12/2013.