ANDAR SEM SAIR DO LUGAR
Morar longe nem sempre é um castigo, pode ser um aprendizado e assim aconteceu comigo. Terminei o primário e na Lomba do Pinheiro não havia ginásio, então fomos em busca do colégio para os próximos quatro anos, sim quatro anos, pois não passar de ano representaria trabalhar durante o dia e estudar à noite. Eu com doze anos sai com minha mãe peregrinando atrás de um colégio. O primeiro que me receitam foi a Escola Agrícola de Viamão, em regime de semi-internato, coisa que eu não queria, pois já tinha escapado de me mandarem para o seminário aos onze anos. Naquela época era assim, alguém receitava e lá ia você, pois seria bom, claro que nossos pais não faziam por mal. Perdemos a carona e lá se foi a Escola Agrícola, então fomos na Escola Técnica Parobé, mesmo sendo pobre a nossa ficha sócio econômica, me alijou do processo de seleção sob a alegação que a minha condição contra indicava a matrícula, e assim fomos até bater nas portas do Inácio Montanha, na secretaria a funcionária nos disse que a preferência era dos alunos da escola e depois os que não tivessem atrasados. Lembro que mamãe saiu chorando, então uma das pessoas que estava esperando atendimento chamou-a e recomendou que fossemos num colégio novo na avenida Bento Gonçalves, passando a fábrica de fogões Geral e lá fomos nós. Era mês de outubro de 1968, o mesmo ano da Primavera de Praga, dos movimentos estudantis na França e das ações fortes dos terroristas no Brasil, mas isto nem chamava minha atenção eu era de outro mundo, do mundo da sede, da sede em aprender, não tinha nada com reivindicações. Chovia uma garoa fina, quando chegamos, fomos atendidos no balcão, preenchemos uma ficha, pagamos uma taxa e fiquei de voltar nos primeiros dias de novembro para realizar o exame de seleção. No ano seguinte comecei o Ginásio. Para quem vinha do fim do mundo foi muito bom, pois bati 6,5 em português, 8,5 em matemática e 9,5 em estudos sociais.
Aquela barreira no Inácio Montanha, por estar atrasado foi humilhante, pois só ali compreendi que burocratas são seres abomináveis e deveriam pagar pedágio para andarem entre nós.
O preconceito burocrático combinado com arrogância matava um ano de qualquer um que saíssemos da escola do município de Viamão e fosse para alguma escola de Porto Alegre. A maldade era tanta que nem percebíamos, pois nos matriculavam no quarto ano "C" e no final do ano passávamos para o quarto ano "A". Assim alguém ficou devendo um ano para todos nós, eu, o Irineu, a Rosa, o Valdir, o Mário, a Edite, a Rúbia e tantos outros.