PARA MINHA PUNIÇÃO
Ysolda Cabral
Depois de uma noite bem dormida, sinto-me melhor. Entretanto, um fato, no mínimo estranho, deixa-me reflexiva... Ontem eu estava extremamente cansada, porém ágil e produtiva. Hoje amanheci descansada, mas sem nenhuma disposição. O Tempo parece colaborar com isso, vez que se arrasta. Tudo hoje está parecendo andar em câmara lenta.
Acordei, como de costume, às 04h30m, com o canto dos passarinhos bem na minha janela. Sorri feliz com a algazarra, mas não consegui levantar de imediato. Permaneci deitada. Alguma coisa me incomodava, deixava-me sem ânimo, triste e muito chateada comigo, sem que eu soubesse a razão. Resolvi fazer uma retrospectiva do meu dia de ontem, para ver se descobria o que estava acontecendo, posto que, quando me deitei, estava com tanto sono que dormi imediatamente, sem, sequer, rezar.
E descobri! Descobri que era a minha consciência que me acusava, sem piedade e com toda a razão. E até me perguntava como pude dormir a noite toda.
Eis os fatos - que confesso como punição e jurando consertar a maldade cometida:
Mandei chamar um mestre-de-obras para combinar com ele alguns serviços que o Condomínio do prédio em que moro pretende realizar. O problema é que ele, entre uma breve resposta para o que eu lhe perguntava, cantava um hino religioso de maneira desafinada, fazendo doer os meus ouvidos.
Várias vezes tentei fazê-lo parar, com alguma consideração sobre aquilo que queria fazer, mas não tinha jeito! Ele respondia rapidamente e voltava a cantoria sem fim. Parei e prestei bem atenção ao seu canto e concluí que o problema maior não era ele: era o hino!
E, sem pensar um segundo, olhei pra ele e falei:
- Moço, eu nunca havia escutado um hino tão feio na minha vida! Veja; meu pai é evangélico e já compôs uma porção de belos hinos para a igreja dele, inclusive o Pastor Eliakim Sá até gravou alguns! E no meio da rua, onde estávamos a olhar o prédio, combinando o que fazer, abri a boca e comecei a cantar com vontade.
Ele a princípio demonstrava surpresa, estupefação e até um pouco de raiva. Vi a hora dele me mandar calar a boca. Mas não mandou! E à medida que eu cantava, sua expressão se apaziguava, dando lugar a certo entusiasmo.
Quando terminei a ''audição'' ele falou: A senhora pode escrever a letra para mim e me ensinar a cantar esse hino?
Respondi-lhe que sim, achando-me o máximo!
Agora, depois desta análise-confissão, começo a me sentir menos lixo.