História da vida

“De chico”, revelou. Pergunto se isso não atrapalha o serviço, mas ela diz que pra tudo se dá um jeito. Havia passado no mercado e comprado uma caixa de algodão. Com ele faz algumas bolinhas e coloca pra dentro. Lá dentro. “Aí não desce, né? Absorve, é assim que fala”. Sem proteção ela não faz – uma única vez ela correu o risco. Diz que não é apenas por medo de doença, mas porque pensa muito no seu amor (ela tem um amor que também é ela). Na verdade, ela tem nojo dos homens. Houve um único homem por amor, aos 13, 14 anos. Com os outros ela apenas ganha dinheiro. Os mais velhos ela trata bem. Os mais novos trata muito mal, que é pra não voltarem mais.

Reconhece que o preço é alto. Como a concorrência é pesada, às vezes faz mais barato. “Quem vê assim, pensa que entra muita grana. Só que eu tenho muita conta pra pagar”. Ela está fazendo faculdade e quer trabalhar na área de saúde. “Quase mil reais a facul, acredita? Como é que vou pagar um negócio desses?”. Por isso faz o que faz, embora odeie. Diz que não é fácil arrumar um emprego. Não tem referências para dar. Seus pais estão na mesma área – mas ela não quer que envelheçam dessa maneira.

Se pudesse faria um livro com os desejos escondidos dos seus clientes. Gente séria, homens de negócios, aqueles que ninguém imagina. Com pedra ume moída mais água e uma seringa sem agulha, ela coloca duas ou três doses pra dentro e simula estar tendo a sua primeira vez. Tem que atender os caprichos, senão não voltam. Mas mantém a higiene: quando termina toma um banho, troca os lençóis e a sua roupa. Sabe que sua vida é dura e diz que está se sacrificando pelos seus pais. O resto da família não está nem aí – “e olhe que tem gente casada, gente que é pra ser direito”. Também não é nada boa a visão que tem de suas colegas na faculdade: “Menininhas que têm de tudo, o papai paga tudo. E elas esnobando, se achando. Não dão valor nem à profissão que estão aprendendo. Desculpa falar, mas é um bando de f.d.p.”.