Feliz Black Friday
Diz a Revista Forbes – a fonte preferida dos jornalistas sem pauta – que a tradição do Black Friday é tão estranha aos brasileiros quanto a lua. Discordo, discordo da comparação – não é porque um país fincou uma bandeira em cima da lua que ela passou a ser mais íntima dos seus habitantes. Além do mais, é como diz o Campos de Carvalho: para a lua tanto faz ser Londres ou São Bento do Sapucaí.
Mas concordo com o mérito, evidentemente. É certamente sintomático de alguma coisa que no Brasil se parta para o consumo adoidado do Black Friday sem passar antes pela Ação de Graças. Também ao contrário dos americanos, nós não passamos a madrugada na fila esperando as lojas abrirem, por vezes perdendo o dia de trabalho – por aí se vê que talvez seja até bom ser estranho às tradições americanas. Mas é justamente em defesa desse tipo de comportamento que a Forbes se posiciona. Parece que há uma maneira correta de passar o dia gastando e que não veio importada junto – a própria economia dos preços parece não ter vindo.
Na origem do dia, está a inauguração da temporada de compras do Natal – pois não é de se imaginar, tanto nos Estados Unidos como aqui, que alguém consiga passar um Natal sem fazer compras de Natal. Mas essa justificativa é desnecessária: o que se comemora no Black Friday é o próprio Natal. Ele é o Natal sem máscaras do comércio, sem aquela necessidade de encaixar Jesus ou sentimentos cristãos em meio aos anúncios. Finalmente, assume-se que aquilo que se celebra é unicamente o nascimento da sociedade de consumo. Satisfazem-se plenamente, em bonita concordância, os desejos de vender e de consumir, sem os quais não existe Natal. E tudo isso sem precisar de reuniões familiares, de preparativos desgastantes, ou de obrigações religiosas. Tiremos os presentes, a ceia e todas as compras que fazem o nosso Natal e observemos se os nossos olhos brilham com a mesma excitação de quem descobre uma oferta imperdível durante o Black Friday.
Boas festas!