A Felix o que é de Felix
Felix - personagem magistralmente interpretado pelo ator Matheus Solano - tem sido o alvo de muitas análises psicológicas, críticas, simpatias e antipatias. Ninguém negaria sua maldade; mas será que toda maldade é inata?
Seu charme é irresistível; sua maldade, quase sempre, explícita. Um personagem que, talvez por ter sido vítima de preconceito durante toda a sua vida, exerce uma tirania preconceituosa contra todos que ele considera estar em posição inferior a dele na escala social.
Uma criança que cresce sem ser aceita pelo pai - a quem passa a vida tentando impressionar, tentando ser amado, valorizando cada olhar e cada migalha de atenção - e que tem o apoio incondicional da mãe em virtualmente qualquer situação, poderá tornar-se um adulto equilibrado? Alguém que teve sua sexualidade reprimida, sendo tratado como um anormal, obrigado a casar-se com uma mulher e ter um filho a fim de salvar as aparências e garantir uma pequena réstia de admiração paterna, poderia ter se tornado alguém amoroso?
As pessoas são diferentes; em muitas situações, vemos rosas crescendo no meio do lamaçal, e espinhos horrorosos nos melhores e mais bem cuidados jardins; mas na situação de Felix, o que eu enxergo é uma criança que cresceu em um jardim de flores falsas e podres. Tudo em sua vida é uma mentira: o casamento dos pais, a origem da irmã, a filiação de seu suposto filho - que mais tarde, ele descobriu ser seu meio-irmão, e seu casamento falso com uma prostituta contratada pelo próprio pai. Todos lindos, bem vestidos e perfumados, mas cheios de podridão e falsidade por dentro. Acho que Felix teve poucas chances de tornar-se alguém melhor. Sua maldade reprimida, quando vinha à tona, era imediatamente sublimada pela mãe, que passava panos quentes sobre tudo o que ele fazia, desde que não fosse ela mesma a atingida.
Assim, Felix cresceu sem princípios e sem limites.
O pior veio à tona - agora que todos descobriram que ele cometeu o imperdoável, o ato mais abominável, cujos praticantes são execrados até mesmo entre seus iguais criminosos em prisões e reformatórios: um quase infanticídio contra a própria sobrinha - sua mãe vira-lhe as costas. Aquela que era seu único porto seguro, a única pessoa a quem ele realmente amava, e que poderia ter alguma chance de modificar-lhe ao menos um pouquinho o caráter, deixa-o sozinho em um mundo no qual ele não foi preparado para viver. Este abandono, além de irresponsável, não seria também um ato cruel?
Qual será o final de Felix? O que ele fez merece perdão? Acredito que o autor preparou para ele o final que ele merece: alguma coisa bem infeliz, como a prisão, a loucura ou a morte. E embora o Felix-personagem seja punido no final, existem na vida real centenas de milhares de Felix que talvez jamais conheçam o sabor da punição. E eles nem são tão bonitos e charmosos.
Acho que entre todos os crimes que Felix cometeu, o segundo pior deles foi o de ter passado toda a sua vida tentando impressionar alguém que sempre o desprezou. Com certeza, poderia ter sido muito feliz se tivesse virado as costas ao pai, como este fez com ele.