ANTROPÓFAGOS DO AMOR.

Se tratamos e falamos de amor, se ele é conteúdo de nossa caminhada, se dele fazemos nosso mais importante movimento, não podemos insular nossa existência e fechar nosso ser na prisão sem comunicação. É difícil, praticamente impossível, passar de pessoas que amam a pessoas que se comem. Mas isso acontece na humanidade, muito. Mas é só com o amor que se vence o desamor. E não será se recolhendo e dando azo a nonadas que se edificará algo, anacoretas nem mesmo suas companhias tiveram, eram na totalidade insanos.

A solidão é diferente do silêncio, um constrói voltado para o interior, pois no silêncio nos encontramos, e nele expurga-se a solidão que se afasta do ser mais excelente, o próximo. Quem ficou sozinho nunca amou e não amará - amor é troca, doação, compartilhamento, ama-se alguém - é personalista e habita um mundo só seu, da pretensa exclusividade. Caminha e não vê, canta e desconhece o som da lira, abraça e não sente.

Fica certo e nos conta a história terem existido antropófagos. É possível que em nosso chão, a América, ainda exista essa ausência de vestígio de humanismo.

Se fosse permitido comer os vizinhos, os homens de hoje começariam a comer-se entre si, seria grande lástima para as virtudes sociais. Mas será que não se comem e a si mesmos?

Para ter a visão desse teatro, desnecessário ir aos tribunais, essa fome de passar por cima dos outros está nas ruas, no trânsito, na inveja, na discriminação.

As nações que hoje são ditas “civilizadas” não o foram sempre. Todas elas foram muito tempo selvagens. Será que ainda não são, com outras roupagens?

A superstição fez imolar vítimas humanas. A incivilidade e por vezes a necessidade as fez comer seus iguais. E hoje, qual a antropofagia ausente o amor? Se foram imoladas muitas infâncias antigamente, crianças enfitadas que tinham um punhal cravado em seus corações para um Deus pagão, hoje são mortas por mísseis, e pior, por pais, mães, padrastos e madrastas.

Onde o maior crime, reunir-se religiosamente para cravar em honra da divindade uma faca no coração de uma menina enfitada, ou hoje sentarem-se em mesa de morte gestores de nações, para determinar a matança coletiva em guerra de muitas infâncias, ou pais, padrastos e madrastas matarem esses seres indefesos?

São os modernos antropófagos do amor, comem suas próprias entranhas, matam a infância, coletiva e individualmente.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 21/11/2013
Reeditado em 21/11/2013
Código do texto: T4580264
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