Sou do Tempo
Por Carlos Sena (Da coleção “Textículos”)
Em que a gente tirava fotos por estar feliz, nunca para postar em redes sociais. Claro que as redes sociais não existiam, só as redes do Ceará que no Nordeste serve pra gente dormir, namorar, tirar uma madorna, um deforete, uma paia.
Sou do tempo da esbórnia – tempos que ser notívago não metia medo e a gente saia de noite para bebê-la como se vinho fosse. Na esbórnia a gente tocava violão, cantarolava em serenatas, varava a noite batendo papo em rodas de amigos com o aconchego da noite nem sempre estreladas.
Sou do tempo que a gente era feliz e sabia. Não que essa consciência fosse estabelecida na filosofia, mas na pratica da liberdade consentida além do horizonte, além dos limites da cultura machista e dominadora ou não. Ser feliz no meu tempo já era um estado: de espírito e de espiritualidade. Dos conformes e das conformidades.
Sou do tempo do ginasial e do científico. Do tempo do exame de Admissão em que a gente se esmerava para passar e ter acesso ao ginasial. Tempo do científico, mas também do Clássico. Tempo da caligrafia, tempo do dever de casa, tempo da tabuada e da Nova Seleta – ou Crestomatia, ou, como podemos dizer hoje, algo como uma antologia de textos para leitura e interpretação.
Sou do tempo da primeira paixão que era sempre pela professora. Tempo do papagaio (pipa), do carrinho de rolimã, tempo da barra bandeira, do subir no pau (aff) de sebo, da roqueira no São João. Tempo do cinema em cinema scope, dos seriados e matinés: Rouba Cofre, Batman, Tarzan, Zorro, eis os que me lembro. O melhor era que as séries aconteciam todos os domingos igual novela nos tempos atuais.
Sou do tempo temperado, diferente dos destemperamentos de hoje. Tempos em que se contavam histórias na porta de casa e que a gente tinha medo do papa figo, da mula sem cabeça, da caipora. Tempos em que os vizinhos trocavam comidinhas uns com os outros. Não havia, naqueles tempos, campainha nas portas, nem precisava, porque a gente entrava na casa dos vizinhos de porta adentro e pronto.
Finamente, sou do tempo das gentilezas: bom dia, boa tarde, com licença. Do tempo do amante à moda antiga que dava flores. Tempo do amor sem ser moda, mas modo de vida. Tempo da poesia, da leitura dos clássicos, do bem falar, do bem escrever e do bem viver, finalmente.
Por Carlos Sena (Da coleção “Textículos”)
Em que a gente tirava fotos por estar feliz, nunca para postar em redes sociais. Claro que as redes sociais não existiam, só as redes do Ceará que no Nordeste serve pra gente dormir, namorar, tirar uma madorna, um deforete, uma paia.
Sou do tempo da esbórnia – tempos que ser notívago não metia medo e a gente saia de noite para bebê-la como se vinho fosse. Na esbórnia a gente tocava violão, cantarolava em serenatas, varava a noite batendo papo em rodas de amigos com o aconchego da noite nem sempre estreladas.
Sou do tempo que a gente era feliz e sabia. Não que essa consciência fosse estabelecida na filosofia, mas na pratica da liberdade consentida além do horizonte, além dos limites da cultura machista e dominadora ou não. Ser feliz no meu tempo já era um estado: de espírito e de espiritualidade. Dos conformes e das conformidades.
Sou do tempo do ginasial e do científico. Do tempo do exame de Admissão em que a gente se esmerava para passar e ter acesso ao ginasial. Tempo do científico, mas também do Clássico. Tempo da caligrafia, tempo do dever de casa, tempo da tabuada e da Nova Seleta – ou Crestomatia, ou, como podemos dizer hoje, algo como uma antologia de textos para leitura e interpretação.
Sou do tempo da primeira paixão que era sempre pela professora. Tempo do papagaio (pipa), do carrinho de rolimã, tempo da barra bandeira, do subir no pau (aff) de sebo, da roqueira no São João. Tempo do cinema em cinema scope, dos seriados e matinés: Rouba Cofre, Batman, Tarzan, Zorro, eis os que me lembro. O melhor era que as séries aconteciam todos os domingos igual novela nos tempos atuais.
Sou do tempo temperado, diferente dos destemperamentos de hoje. Tempos em que se contavam histórias na porta de casa e que a gente tinha medo do papa figo, da mula sem cabeça, da caipora. Tempos em que os vizinhos trocavam comidinhas uns com os outros. Não havia, naqueles tempos, campainha nas portas, nem precisava, porque a gente entrava na casa dos vizinhos de porta adentro e pronto.
Finamente, sou do tempo das gentilezas: bom dia, boa tarde, com licença. Do tempo do amante à moda antiga que dava flores. Tempo do amor sem ser moda, mas modo de vida. Tempo da poesia, da leitura dos clássicos, do bem falar, do bem escrever e do bem viver, finalmente.