OS INFINITOS TONS DO VERDE
Nessa vida em que o mais importante axioma é "O Tempo é Dinheiro”, não são muitas as pessoas que se preocupam ou se interessam em observar o que se passa ao seu redor. São tantas coisas e situações com as quais nos defrontamos, diariamente mas, mesmo assim, as pessoas passam sem dar atenção a quase nada a não ser aos ponteiros do relógio e as conseqüências do seu indefectível circular ao redor do eixo...
Das que se prendem aos detalhes há umas que buscam o lado menos brilhante dessas coisas preferindo enveredar pelo embaçado que lhes chama atenção. Comprovando isso há um livro fazendo sucesso, na praça, escrito pela britânica Erika Leonard James, sob o título de “Os Cinquenta Tons de Cinza”.
Não irei deter-me no conteúdo. Tive a atenção voltada para o título, ou melhor, pelo fato da autora haver escolhido logo a cor cinza com os seus cinquenta tons. Afinal sempre entendi essa cor como algo escatológico, ligado à morte, à extinção, ao último resíduo de algo consumido pelo fogo. Afinal, o cinza é a ante-sala do preto e o preto é a ausência de cor.
Tudo aconteceu a partir de um detalhe bem interessante ocorrido na saída do consultório médico. Quando ia saindo meu médico reforçou o aconselhamento, em tom de reprimenda: Você precisa tirar a bunda da cadeira e cuidar de fazer algum tipo de exercício físico! Cuide desses triglicérides que já estão querendo ultrapassar os limites! Trate de arranjar tempo, pelo menos, para umas boas caminhadas!
Aquilo ficou martelando na minha cabeça e, hoje, pela manhã, resolvi dar início ao tal de exercício físico. Vesti uma bermuda folgada, uma camiseta de malha fria, um sapato velho, óculos ray-ban e um boné branco para proteger a calva incipinte. Em seguida botei a cara na rua, olhei para um lado, olhei para o outro e saí em direção a lugar nenhum...
Cinco minutos após, estava caminhando em uma longa avenida de Sobradinho e faltavam dez minutos para as dez horas. Era uma bela manhã ensolarada, com temperatura amena, sentindo na pele a umidade da chuva que caíra na véspera.
Mal havia caminhado uns cem metros topei com uma calçada larga, gramada, em cujo centro estavam, imponentes, várias árvores de grande porte. Uma delas era uma veneranda mangueira carregada de frutos. Muitos deles, caídos ao chão, não resistindo ao sacolejo do vento no mau tempo da véspera.
Não resisti! Catei duas frutas, passei-lhes o lenço e mergulhei os dentes naquela polpa amarelinha, doce e fresca, como só as mangueiras da rua sabem produzir. Uma delícia de perfume e de sabor!
Mais adiante, nas proximidades do quartel do Corpo de Bombeiros, fui obrigado a desviar a atenção do paladar, intimado que fui, pelo fantástico espetáculo que se abria bem diante dos meus olhos: Uma senhora “buganvília” não deixava ver nenhuma folhinha verde; toda a dimensão da copa estava florida, com uma espetacular coloração violeta. De tantas que eram pareciam ser uma só flor. Acho que é por isso que a chamam de “maravilha”. Amanhã irei fotografá-la!
Há poucos metros, antes, pude cruzar com uma família de flamboyants, com cada membro querendo chamar mais a atenção dos passantes. Estavam todos floridos e a passarada fazendo a maior festa.
Prosseguindo minha andança, mais para a frente, o chão começou a apresentar manchas de um preto quase azulado. Era um frondoso pé de Jamelão, que por aqui chamam de jambolão, também carregado de frutos que se ofereciam aos cachos. Ora! Como também sou mortal, tratei de colher alguns! Saí comendo e cuspindo os caroços na maior satisfação da vida, sem me importar com a boca e os dentes manchados de roxo!
As árvores graúdas iam se sucedendo, umas após as outras. Sobradinho parecia uma floresta se abrindo em flores, cores e frutas. E pelas ruas, para qualquer um que quisesse se lambuzar. E com aquele gostinho especial das coisas que não custam nada, pois são de graça!
Quando dei por mim estava em uma localização em que, devido à altura da cidade, abria-se diante dos meus olhos um fantástico panorama onde era imperativa a exuberância do verde. Nos montes, nas planícies, nos campos, nas matas, nos inúmeros tipos de arvores, arbustos, copas o verde se mostrava como a imperatriz das cores. Até mesmo na profusão das cores, nas árvores floridas, predominava o verde como uma espécie de moldura.
Foi então que pensei em contar quantos tons de verde estavam ao alcance da minha visão deslumbrada. Não adiantou! Nem dava para começar! Os tais “cinqüenta tons do cinza”, da escritora britânica, eram fichinha diante da infinitude dos tons do verde. Eram tantos os matizes que meu vocabulário, de tão pobre, não tinha palavras para dar nome a cada um deles.
A essa altura dos acontecimentos meu exercício aeróbico estava no final e já me via transpondo a porta do edifício em que vivi por um tempo, o “Van Gogh”. Então, com a alma livre, esvoaçando pela imensidão do verde, pensei: Esse grande artista do pincel e das cores diante da grandeza da Arte que contemplava, certamente, diria: O Paisagista que projetou essa aquarela só pode ser “hors concours"!
Amelius – 19/11/2013 – 22:37Hs