O dia em que eu vi a Glória Perez

“Quem matou Odete Roitman?”

“Não é brinquedo, não”

“Pelas rugas de Matusalém!”

“Fui!”

Por mais de 40 anos, a tv aberta representou a principal forma de entretenimento da população brasileira. Nesse sentido, a novela sempre teve papel protagonista. Assim, provavelmente, você já deve te dito ou ouvido alguma das frases acima.

Quando se fala de novela, logo alguns atores são lembrados: Lima “Sinhozinho Malta” Duarte, José “Roque Santeiro” Wilker, Paulo “Odorico Paraguaçu” Gracindo, Glória “Ruth e Raquel” Pires, Renata “Nazareth Tedesco” Sorrah. Porém, os autores também têm grande destaque. Um deles é Glória Perez.

Quando se fala de Glória Perez, não visualizamos, por exemplo, o bairro do Leblon, algo que é muito comum nas novelas de Manoel Carlos. Glória prefere, na maioria das vezes, os bairros do subúrbio carioca, lotados de tipos humanos dos melhores, como a espetaculosa Dona Jura e os trambiqueiros Raposão e Ligeiro de “O Clone” (que tinha um núcleo ambientado no bairro de São Cristóvão, Zona Norte carioca). Dessa forma, a trama fica humanizada, mais próxima do povão que tanto assiste e curte esses folhetins.

Eu me sentia tão próximo de novelas que muitas vezes me imaginava pertencendo ao núcleo cômico de uma delas. Nunca quis ser o mocinho, até porque ele sofre a novela toda, nunca ri e, ainda por cima, corre o risco de levar umas cem chibatadas. Porém, na Fazenda Botafogo não tinha um curso de teatro e muito menos algum olheiro/descobridor de talentos que pudesse observar os meus dotes artísticos e me levar para a Grobo. Assim, sempre me vi um tanto quanto distante do estrelato. Além disso, apesar da imaginação fértil, eu era tímido, logo, dificilmente conseguiria atuar de maneira satisfatória.

No entanto, anos depois, já um emergente morador do Grajaú, hoje tive uma grande chance. Não, não fui figurante na temporada de Malhação que se passa aqui no bairro (“uma rodada de suco pra galera!”). Quando estava fazendo hora numa livraria em Ipanema antes de ir dar aula particular (sou professor), quem eu vejo entrando? Glória Perez! Tantas coisas passaram pela minha cabeça... Maya, Sol, Tião, Dalit, Lucas, Diogo, Ciganos, Barriga de Aluguel. Olha, parecia um sinal: enquanto aguardava, cansado, a hora da aula, aparece alguém que poderia me encaminhar para a realização de um sonho!

Sonho esse que não é ser ator, mas escritor, roteirista. Afinal, tipos humanos diferenciados eu conheço de sobra, pois tenho exemplos na família, nos amigos e até eu mesmo sou um deles.

Primeiramente, pensei em dar para ela um currículo meu, mas eu não tinha qualquer exemplar comigo. De que adiantaria também? Duvido que ela precise de um professor de português. Pensei em dar meu cartão, também de professor, mas que tem meus contatos, minha página do Face etc, mas duvido que ela me adicionaria. A ideia mais plausível seria passar para ela o link dos meus textos aqui no Recanto. Eu entregaria o endereço num papel (explicando brevemente do que se tratava), mas duvido muito que ela teria o trabalho de guardá-lo, chegar em casa, ir ao computador e digitar até chegar ao meu perfil. Caso eu passasse o bilhete, provavelmente ela pensaria...

(a) Nossa, ganhei um torpedo?

(b) É sempre bom ter um papel para rascunho.

(c) Diogo Pomba... Bomba?

Porém, ela poderia pensar também o seguinte:

(a) Hum, ideias, quem sabe uma novela com o amor impossível entre um nerd e uma panicat?

(b) Um etíope e uma sueca?

(c) Um homem célebre – versão emoderna?!

Enfim, fiquei apenas no “se” e no futuro do pretérito. Acho que teria sido melhor ver o Silvio Santos. Ou alguma subcelebridade pagando peitinho.