Pequenas histórias 010
Vejo a máscara
Vejo a máscara refletida no espelho sujo do banheiro e, indago-me se não será o momento certo para terminar minha atuação no papel ignaro da vida e, antes do final do ato, me retirar discretamente e pousar minha carcaça nos trilhos urbanos que cruzaram comigo em cada abraço, em cada beijo, e em cada amor caçado nos meandros noturnos da cidade que nunca dorme, e, que me engole.
Minha poética é pouca para ser contada num pequeno drama de um ato. Por isso colo sentimentos que pairam além de mim e para mim. Busco nas linhas indefinidas o traço certo da palavra como o bêbado traça na calçada seus trôpegos passos.
E escrevo na luz da ilusão cujos brilhos refletidos por faróis opacos dos nervos ao cruzar estradas ansiosas e infinitas. Eu sou o que sou não sou o que gostaria de ser e, muito menos, o que gostariam que eu fosse. Eu sei dos meus limites todos os dias quando meus olhos se abrem para a felicidade branca das manhãs. Apesar da incapacidade de ser indivíduo ágil e de gestos largos e confiantes, sei onde piso e sei desviar das pedras escorregadias, mesmo que a tentação seja atraente, sei me controlar. Ainda não perdi a consciência dos fatos e nem dos atos. Não tenho noção precisa das conseqüências, talvez isso castro meus projetos.
A timidez, na mesma proporção em que ela cresce a cada projeto elaborado, ela diminui a cada projeto finalizado. É um equilíbrio que algumas vezes despercebido, pende para um prato mais que a para o outro. E para que fiquem na mesma linha de equilíbrio, há uma batalha onde saio lesado e frustrado. Possa não parecer, mas não deixo de lutar. Aquele que não luta é um morto-vivo rastejando na própria desgraça em sentir-se vivo.
A Besta apocalíptica comanda essa geração de loucos varridos que só buscam prazer instantâneo e fácil. Louvores são entoados ao consumismo fedido das drogas injetáveis, inaladas, degustadas e por outros meios menos convencionais.
Sou o que sou e isso me basta.
pastorelli