O Guarani, Saga Mestiça (Ceci e Peri)
As protagonistas centrais do romance “O Guarani” de José Alencar simbolizam o início de grande processo de caldeamento étnico, que continua até nossos dias e, ainda, continuará por longo período, para realizar a síntese da diversidade humana planetária.
Sem dúvida, o palco dessa festa étnica e cultural é o Brasil.
Para alguns e até, quem sabe, para muitos, essa afirmativa pode parecer exagerada, mas se observarmos o percentual de mestiços que, na realidade, não podem ser enquadrados em nenhuma das opções das pesquisas: negro, branco ou índio, concluiremos que somos, dentro desse conceito racial ultrapassado, um povo sem raça, ou melhor, uma etnia em formação.
Então, apesar de o romance fugir da realidade dos efeitos dolorosos da dominação pelo colonizador, de mitificar tanto a fidalguia portuguesa quanto valores do indígena, nosso entendimento é que não deixou de registrar os protagonistas Ceci e Peri, como atores primordiais desse caldeamento étnico no solo brasileiro.
Cecília, transformada em Ceci, por Peri. Ceci verbo da língua indígena que significa magoar. Pois era magoado que Peri se sentia com a indiferença de Cecília.
Ceci dos olhos azuis, da pele alva e pura como lírio, dos cabelos derramados em cachos dourados, da boca rubra, úmida, de colo delicado e insinuante e de andar que misturava graça e realeza. Apesar de sua descendência fidalga e por viver afastada do burburinho da corte, identificava-se muito mais com a natureza que imperava no seu ambiente do que com as pompas e galas da corte. Educada nos dogmas e na fé cristã.
Peri dos olhos negros, da pele morena, dos cabelos lisos e negros, de boca iluminada pela alegria de sorriso, de corpo talhado para vencer aos desafios da luta cotidiana pela sobrevivência. De descendência da fidalguia indígena e tinha a natureza como lar e templo.
Apesar desses grandes contrastes e de terem dificuldades até na comunicação, justificativas do improvável encontro amoroso entre os dois, alguma coisa mais forte regida pelo destino, para alguns e para outros por Leis Divinas, começava sua manifestação pela linguagem universal do coração.
O universo conspirava para que Ceci e Peri cumprissem a missão como atores primordiais desse caldeamento étnico. A lenda indígena de Tamandaré seria mais uma vez encenada pelo amor dos dois.
De mesma forma como na lenda indígena Tamandaré, que Tamandaré e sua esposa se salvaram de um dilúvio abrigando-se na copa de uma palmeira desprendida da terra e alimentando-se de seus frutos e, ao término da enchente, descem e povoam a Terra, Ceci e Peri, ao término da enchente se perdem no horizonte, se dissolvem no futuro, onde será construída a síntese da diversidade humana planetária.
Sim será no Brasil o caldeamento das mais diversas etnias e, num processo lento, mas constante, o nascimento da síntese gerada por esse processo dialético, em que teses e antíteses dessas etnias convergirão para o renascimento de nova humanidade.
“Ceci e Peri” são rimas e melodia para registrar Ceci que, assim como Iracema, também é símbolo do ventre original do grande processo de miscigenação no cadinho Brasil.
Ceci e Peri
Beleza no azul dos olhos,
realeza e graça de colibri,
colo insinuante adornado
com cachos dourados, é Ceci.
Peri dos olhos negros,
seu templo, a natureza,
bravura dos guerreiros,
sorriso de luz e pureza.
Improvável é o amor
se difícil for a comunicação.
Sonhos cedem ao clamor,
quando o falar vem do coração.
Como na lenda de Tamandaré,
universo em conspiração,
copa de palmeira, força e fé
são de Ceci e Peri a salvação.
Num horizonte distante
se perdem Ceci e Peri.
E no amor do casal errante,
de nova etnia o surgir.
A canção Ceci e Peri encontra-se nesse mesmo site nos endereços:
http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/57945 (voz e teclado)
http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/58648 (voz e violão)