Dentes e elásticos
Não sou o tipo de pessoa que tem medo de dentista. Depois que você sobrevive a um tratamento de canal, qualquer outra coisa que ele fizer parece frágil e indolor. E as minhas últimas visitas ao dentista haviam sido bem tranquilas, apenas manutenção do aparelho, que eu já me acostumei a usar. A muito custo, é claro. Escovo os dentes seis ou sete vezes por dia – ou seja, todas as vezes em que como alguma coisa. Não é algo muito agradável de se fazer, mas ruim mesmo é passar o fio dental – coisa que faço duas vezes ao dia. São cerca de 15 minutos que você tira para enfiar entre os ferros da sua boca uma agulhinha presa a um pedaço de fita para esfregar todos os seus dentes como se estivesse engraxando um sapato. Mas o ser humano se acostuma a quase tudo.
Na penúltima vez que fui ao dentista tive uma novidade: agora, além dos ferros, eu deveria colocar um pouco de látex boca adentro. Eram dois elastiquinhos que precisavam ser esticados dos caninos superiores até os segundos molares inferiores. Foi quando eu me dei conta de que havia uma serventia para aqueles ganchinhos colocados estrategicamente em alguns dentes. Desde o início estava previsto que eu deveria encaixar elásticos em cima deles. A dentista, evidentemente, não me contou nada, pois o paciente é sempre o último a saber. Usemos, pois, os elásticos.
Fiz como ela mandou: só tirava os elásticos para comer. E aparentemente é muito raro que alguém faça isso, pois quando voltei lá a dentista me encheu de elogios. Disse que dava gosto trabalhar com quem colaborava. E o que ela fez para premiar a minha colaboração? Dobrou o número de elásticos. Tascou logo quatro pra dentro da minha boca. Agora em forma de triângulos – um normal e outro invertido em cada lado. Minha boca começa a se parecer com os postes cheios de fios de luz. Temo que na próxima sejam 8. Mas usarei, como bom alemão disciplinado que sou. No fundo, nem é tão ruim assim. Com algum esforço você consegue até abrir a boca.