Quando o interfone tocou

Passava um pouco da hora do almoço quando o interfone tocou e ele atendeu distraidamente. Estava de chinelo, bermuda e vestia a camisa de um time. “Alou?”. Houve um silêncio do outro lado da linha e ele repetiu: “Alou?”. Ouviu então uma voz de mulher: “Guilherme? Sou eu, Guilherme”. Mil coisas se passaram rapidamente pelo cérebro de Guilherme até que ele identificasse aquela voz e entendesse do que se tratava. Quando conseguiu, só pôde balbuciar: “Nossa”. E, do jeito que estava, desceu para recebê-la.

Então era verdade: ela havia mesmo vindo. Incrível. Quantos quilômetros havia entre eles mesmo? Guilherme era todo perguntas: Como é que você achou a minha casa? Quando você decidiu vir? Você se perdeu? Onde almoçou? Quanto tempo pode ficar? E com essas perguntas disfarçava o nervosismo que sentia ao vê-la pela primeira vez – ele desconsiderava todas as vezes que se viram pela webcam. A tudo ela respondia calmamente.

Subiu para o apartamento disposto a se arrumar para que saíssem – ela tinha apenas algumas horas até o vôo de volta. Decidiu levá-la para o Jardim Botânico. Nenhum dos dois sabia o que o outro pensava. Ela não sabia que Guilherme já não a considerava mais uma possibilidade de romance. Guilherme não sabia que ela havia feito essa viagem justamente para dizer que não iria mais esperá-lo. E nenhum dos dois sabia que durante aquele passeio estavam mudando de ideia. “Eu acho que posso muito bem amá-la”, pensava Guilherme. “Eu desisti de desistir assim que o vi”, refletia ela. Impactados pela presença real do outro, já não consideravam nem os quilômetros de distância.

Tão entretidos estavam que quase perderam a hora do vôo. Ela havia planejado o seu discurso de despedida para a hora do embarque, mas já não queria se despedir. Houve apenas um abraço apertado e ela se foi. Naquela mesma noite ela leria no seu computador um gracejo de Guilherme: queria saber se ela aceitaria ser a sua senhora. Cheia de vida, ela respondeu que sim.