AINDA BEM QUE A PING ERA BOA
O pai nunca foi de beber. Nem de fumar. Quando muito – e quando podia – tomava um gole de caipirinha na praia. Sempre foi comedido, comedido demais para meu padrão errante. Sua mãe, minha bisa, não dizia, mas insinuava que estávamos ante um iluminado, quase santo. Mãe que se emenda não é mãe. Bisa era mãe.
A mãe – a minha, não a do pai – revirava o nariz: “Minha sogra não tem vergonha de pecar”.
Tio Antônio era o exato oposto do pai. Bebia e fumava sem descontinuar. Gostava dele. Afinal, fumar e beber tanto, como ele fumava e bebia, era coisa para poucos. Tio Antônio morreu cedo. De ataque cardíaco. Dizem que tinha coração grande, que fora mordido pelo barbeiro (o inseto, claro) na infância. Até hoje o pai duvida da versão oficial. Ninguém lhe tira da cabeça que o fumo e a uca lhe cobraram a conta.
O fato é que o pai passou a vida intrigado com uma das manias de tio Antônio:
-- Como pode alguém virar um copo de cachaça, fazer careta medonha, se retorcer por inteiro e ainda dizer que “pinga boa”? Se a pinga fosse ruim, que cara ele faria?
A pergunta continua sem resposta. Tio Antônio se foi. E do inseto que o mordeu não se tem notícia.