A mentira
A mentira, mal intencionada, saiu em praça pública usando a capa da verossimilhança. Com auxílio de bengalas subiu o degrau da tribuna e, ao chegar no topo, confiante e envaidecida, conclamou o povo indolente e obtuso que andava disperso pela cercania.
Ao ver o vulto fugaz trepado no púlpito, a massa entediada aproximou-se em reunião devota sem perceber que era falso o manto cândido. A voz troante da enfatuada mentira, sonoridade repleta de falsidade que açulava a discórdia com insídia descabida, proclamou aos quatro ventos, enlevando os ouvintes num discurso sem fundamento, que era ela a veracíssima VERDADE. Única! Sem meias medidas.
A multidão imprudente ouviu absorta a ladainha. Ficou encantada e de tão emocionada ovacionou com efusão o disse me disse. Sentindo-se respeitada e honrada nem ponderou sobre o discurso aparente e acatou a fala fingida imediatamente. A partir de então o falso conceito, a máxima invertida, já era direção e norte pra massa reunida.
A mentira iconoclasta se multiplicou. Agora, feito uma salamandra gigante rodeada de partidários convictos, caminha pelas ruas apinhadas com sua bandeira desfraldada cooptando novos sectários. Essa mentira provadamente eloquente não encontrou obstáculo e se agigantou. Os sequazes já são contados às centenas e, daí a pouco, somarão milhões.
E depois do milhão, toda mentira muda de categoria.
Depois do milhão, não existe mais boato.
Depois do milhão, é tudo verdade.
Depois do milhão, É LEI!
"O homem só mata ou aceita morrer pelo que ele acredita"
(Jean-Paul Sartre)
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"Os homens não poderiam viver muito tempo em sociedade se não se deixassem enganar uns pelos outros."
(Francoise de La Rochefoulcaud)