Iguape Do (Des) Amparo
Passados trinta e dois anos em que presencio nossa cidade em constante e vertiginoso declínio, preocupa-me o habitual desprezo com o qual Iguape é tratada. Assim, se exponho o problema gerado pelo constante descaso, não é para destacar-me diante de grupos ou de algumas pessoas. É com o sentimento de que possamos, afinal, ao menos esperar atitudes mais sábias e condizentes da admistração pública, seja ela municipal, estadual ou ainda federal, ao tempo em que lembro o quanto nós podemos realizar algo para mudar essa realidade.
As famílias têm crescentes dificuldades econômicas para a sobrevivência e, se digo econômicas e não necessariamente financeiras, é em razão do diminuto emprego de recursos geradores de investimentos – públicos e privados –, bem como da aplicação da capacidade tranformadora das pessoas em nossa cidade. Programas de auxílio, aposentadorias e outras transferências de renda do governo federal resultam em melhorias financeiras e, por vezes, mascaram a profundidade do problema que enfrentamos.
É fácil utilizar-se do caminho da desistência evidenciado pelo contínuo êxodo das famílias iguapenses. Eu poderia, por exempro, não exercer sequer o direito de escrever e dividir estas considerações com o leitor. Ou poderia, ainda, mudar para outra cidade. Isso seria uma solução? Creio que não. Daqui a mais trinta anos, olharia para Iguape e possivelmente eu a veria em condições mais precárias do que aquelas em que a deixei. Não tenho dúvidas de que essa sensação seria muito pior do que lutar até o fim para reverter esse quadro, por maiores que sejam as dificuldades.
A indolência em realizar o que é preciso, postergando decisões e adiando atitudes, tem colaborado para o atual cenário. Não dispomos mais do manejo da produção pesqueira; tal é pequeno o atual volume que é mais cômodo mandá-los in natura para os centros urbanos maiores. Houve uma preferência pelo caminho mais fácil, nessa ordem: desativaram-se instalações de processamento de pescados e com isso se desarticulou o setor. Abandonaram-se serrarias e desapareceu o processamento de madeiras em nossa cidade, em face da ausência de planos de manejo para caxeta. Deixaram à deriva a náutica e agora tampouco vemos embarcações em nosso mar de dentro, desaparecendo empregos em nosso cenário. Restaram tranqüilas águas e algumas solitárias canoas. Houve uma silenciosa renúncia das pessoas em lutar contra a tendência de declínio. Então, acredito que somente outras pessoas poderão reverter, se desejarem, esse turbilhão que arrasta a todos para um escoadouro.
Se tais condições são provindas em parte por gestões públicas inadequadas, paralisadas pelo comum equívoco entre os conceitos do que é recurso privado e público, e se houve sucessiva insipiência na admistração pública municipal, apresenta-se com uma certa lógica esse longo processo onde vemos Iguape sem cuidados; a preocupação da gestão pública seria então centrada em características privadas, cujos interesses são voltadas ao grupo que estiver ocupando o poder, tal como se os Iguapenses elegessem “donos temporários” para a cidade e não administradores.
Assim, mesmo que não haja amparo do chamado setor público, é necessário que nos levantemos; é urgente que as pessoas comuns se envolvam com as questões que nos vêm aflingindo. Podemos nos capacitar para não ficarmos à margem da história, criando as condições para se buscar investimentos privados para nossa cidade, enquanto fiscalizamos a aplicação do dinheiro público em efetivo benefício de toda sociedade. Se vigiarmos o destino dos parcos recursos públicos evitaremos que sejam direcionados exclusivamente para os grupos que ocupam o poder.
Temos o direito de vencer nesse local e criarmos um futuro melhor, ao menos em nome dos nossos filhos, já que escolhemos estas paragens para viver. É tarefa simples exercer tal direito; é só cumprirmos as responsabilidades individuais e aquelas assumidas diante da sociedade. Iguape pode ser amparada ou desamparada, então, pelas pessoas que aqui se encontram.