Inocência Perdida*

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O dia amanhece ensolarado, como um dia que nasce alegre e colorido como as flores dos jardins.

Se aproximando o Natal, comecei a programar meu dia, pois a disposição que me movia fazia-me agir rápido, para não perder tempo. E

nessa disposição, sai de casa em busca de um ponto de ônibus, já que o

trânsito caótico, me fez deixar meu carro na garagem. Depois de algum

tempo, chega o ônibus que me levaria ao centro do Recife, onde iria às

compras de Natal.

A manhã esquentava e o sol sem pena nos fazia suar. Enquanto sentava, procurando um melhor lugar, tive o primeiro aborrecimento do

dia, quando perguntei ao motorista

-Moço, qual o lugar do sol? (fazendo referência ao local onde o sol seria mais forte.) ele olhou para mim e respondeu totalmente aborrecido,

-Sei lá moça, o lugar do sol é do lado de fora. Alguns passageiros riram

e outros como eu ficamos chocados, mas, seguimos em silêncio.

Pela janela via a rua clara e movimentada. Aos poucos tudo ia ficando

para trás; garotos brincando nas calçadas, mulheres com sacolas nas mãos suam com o peso das compras. Carros buzinam, o sinal fecha, uma passeata dificulta o trânsito e causa cansaço em todos. Nos bares seus clientes, tomam alguma bebida para refrescar o calor que a cada

momento aumenta com o sol espalhado por cima da cidade, fazendo os telhados se moverem.

Chego ao destino. Ao descer do ônibus, parei .Surpreendi-me! Dentre

tantas pessoas ao redor notei uma criança, dessas que na rua ficam a

pedir esmolas aos transeuntes. Estava apenas cobrindo sua nudez um

minúsculo calção rasgado e sujo. Sem camisa, mostrava um peito ra

quítico, bronzeado pela exposição diária ao sol.

Paralizada, surpresa, incapaz de despregar os pés do chão, de olhos abertos, olhava aquela criança e descobria nela mais do que ela mostrava. Ele, era sem se dá conta alegre e triste. Alegre, por não

entender qual era seu papel na vida que tinha. Triste, sem se dá conta

que a ele estava sendo negado o direito de ser criança e de ser feliz.

Mesmo assim refletia sua dor, como o sol: claro, transparente e forte

desdenhando da família, da casa, do estudo, da saúde desconhecendo a dignidade.

Sem nada, agia como um homem pequeno e marginal, não entenden

do o sentido de viver, vivendo o presente sem esperança de ter um futuro, aprendendo na escola da vida a roubar, matar, se drogar.

Coisas que para ele seriam os verdadeiros valores, sinônimo de poder de viver de ser respeitado.

De repente, ágil dá pulos, rodopia na calçada quando percebi um riso

amargo num canto da sua boca, e no outro canto uma chupeta suja e

rasgada. Chegava perto das pessoas e com os olhos brancos e tristes

mãos estendidas a esperar trocados. Ficava alegre quando recebia indo comprar pipoca. Quando não recebia, como agora, sentava no chão com

os braços apoiados nos joelhos que sustentava também um rosto ino

cente, uma criança carente tendo na mão uma chupeta suja e rasgada

e na boca um cotoco de cigarro encontrado pelo chão.

Fica visível o retrato de milhões de crianças que caminham para um,

futuro de desavenças, de desvalores, de banalização da vida. Ele era a

representação do descaso do Estado em relação as suas crianças.Era a representação viva da falta da escola. Era na escola da vida o que hoje

todos nos tememos, um exército de crianças que foram crescendo, e se tornando adolescentes maus, cruéis, já dispondo de atitudes bárbaras

para ter o que não podem. Se o Estado não tomar medidas que possam mudar essa situação, já já, será impossível viver de forma tranquila no

nosso país que se transformará em um país de vândalos.

Por outro lado, a impunidade que assola esse país em relação aos que

tem posses, aos governantes que são corruptos favorecem a esse estado calamitoso em que vivemos.

Enquanto pensava, procurei aquele a quem olhava. Ainda um rostinho inocente que sem ter consciência, nem sabe que é gente.

Para mim, seu sorriso refletia um triste quadro que se apresenta a largos passos e que nos vai custar caro. Um triste quadro de rua, que dou o título de "Inocência Perdida" ou "O herói Bandido".

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Alzira Paiva Tavares

Olinda 05/11/2013

arizla
Enviado por arizla em 05/11/2013
Código do texto: T4558435
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