O meu São Martinho

O São Martinho é comemorado no dia 11 de Novembro.

Antes de me debruçar no tema que se festeja nesta data, vou enunciar algumas curiosidades referentes a este santo.

S. Martinho é o primeiro santo não mártir na história dos santos. Como se sabe, a maioria das datas comemorativas dos santos é o dia da sua morte, quando deveria ser, na minha modesta opinião, o dia do seu nascimento. Porém, no caso de São Martinho o dia da comemoração, não é uma coisa nem outra, o dia deste Santo celebra-se a 11 de Novembro, no entanto faleceu dois ou três dias antes em Candes, mas conta o dia que foi enterrado, no ano de 397, em Tours, França.

Passando um pouco à frente, em Portugal, também se comemora este Santo com magustos e água-pé, que é, nada mais, nada menos do que um vinho de pouco teor alcoólico.

Embora se diga que “no dia de São Martinho vai à adega e prova o vinho”. Acontece que o vinho ainda está cru e impróprio para se beber, uma vez que o vinho precisa de três a quatro meses para “cozer” e clarificar.

É no entanto um dito que vale o que vale. Assim como se diz que nas vésperas (dia dez), é dia dos profissionais (no que respeita aos excessos de bebida que se cometem nesse dia) e o dia onze é o dia dos amadores.

Teria eu os meus dezoito anos e a firma onde trabalhava fez um magusto para todo o pessoal. Entre castanhas, chouriço e febras assadas, fui regando as goelas com o que parecia ser um vinho fraco, pouco mais que água (água-pé), sempre incentivado pelos mais velhos, que não me deixavam o copo estar vazio nem permitiam que criasse teias de aranha.

De maneira que fui bebendo, já quase ao desafio e não parecendo que os meus tenrinhos dezoito anos transpirassem falta de experiência, na digna arte da confraternização.

A coisa aqueceu quando me colocaram em cima de um escadote a fazer um discurso de agradecimento à entidade patronal (honra dada ao mais novo, naquele convívio de profissionais). Logo eu que nunca tive dotes oratórios. Engano meu, a água-pé desenferrujou-me a língua de tal modo, que os patrões, entre risos e lágrimas ofereceram-me como prémio, uma caixa de vinho verde (o que o vinho faz!).

A brincadeira acabou lá para as tantas. Eu com uma “bezana” (bebedeira, carraspana, piela, cadela, borracheira, porre, embriaguez, e sei lá quantos mais sinónimos), mas sem largar a preciosa caixa de vinhos, fiz o caminho de regresso até casa. A meio do caminho, cansado de tanto “discursar”, sentei-me no chão e adormeci. Sei que caí numa pequena ribanceira onde me sentei, sem no entanto acordar. Acordei passado umas dez horas depois, na minha caminha e com uma dor de cabeça que parecia que rebentava. E pior fiquei, quando não vi a caixa de vinho, fruto da minha eloquência.

Contaram-me dois dias depois, que dois colegas, a mando de um dos patrões preocupado comigo, vieram com uma carrinha no meu encalço. Com muito custo retiram-me da ribanceira e como tinha as chaves de casa no bolço, meteram-me na cama sem que eu desse sinal de vida, tal era o coma alcoólico.

A partir daí, comecei a respeitar a água-pé como se de um grande vinho se tratasse e a perceber que nesta coisa de profissionais, não há lugar para amadores.

A ter também mais respeito pelos chamados “seca-adegas”, não pela alegria que vivem no momento, mas imaginando o sofrimento das ressacas e entender o bêbado, que tem razão quando diz: «Toda a gente olha para o vinho que eu bebo, mas não reparam nos trambolhões que dou». Ou ainda o outro, que perante o sermão da mulher que dizia: «Ó meu desgraçado, mas tu queres acabar com o vinho?» Recebe como resposta – «Eu bem tento, hic… mas não tenho quem me ajude!».

Lorde
Enviado por Lorde em 05/11/2013
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