TRILHA? SÓ DE CROCHÊ
Nunca fui chegado a aventuras. Mesmo quando jovem, jamais me passou pela cabeça saltar de asa delta, escalar montanhas ou andar de patins. O máximo que me permiti foi jogar futebol. Embora não seja considerado um esporte radical, o futebol foi, ao menos pra mim, atividade de alto risco. No início, me escalavam na ponta esquerda. Depois, me colocaram sob as traves. Não me dei bem em nenhuma das duas posições. Destro, meus cruzamentos eram sempre para o lado esquerdo, na direção da torcida. Jamais enviei – como esperavam o técnico e o centroavante de meu time – a bola para o meio da área adversária. No gol, poderia ter me dado bem, mas a miopia me atrapalhou um pouco. Desisti do esporte bretão, quando descobri que era a alegria da torcida. Da torcida adversária, porque a minha só me dirigia impropérios.
Dizem que os anos nos tornam mais prudentes. Tenho pra mim que a coisa não é bem assim. No meu caso, é o medo que fala mais alto. Há dias, estive no Parque Nacional de Itatiaia. Fui até aonde o carro me levou. Minto. Cheguei a descer, a pé, uns cento e poucos metros de escada, para ver uma cascata muito da mixuruca. Não devia ter ido. Se tivesse idealizado a dita cuja, eu certamente teria dela melhor impressão. E não teria dado tanta alegria às muriçocas. Voltei empolado. Minha mãe sempre me disse que tenho sangue doce. Não sei, nunca provei. Se não posso ver sangue, desmaio, que dirá degustá-lo?
O fato é que fui vítima da má sinalização. Por isso, embarquei na aventura. Só na volta, ao ler a placa advertindo sobre o que a trilha nos oferecia, percebi o risco que acabara de correr. Como alguém, no perfeito gozo de suas faculdades mentais, pode cair num canto do vigário desses? Os alertas são estarrecedores: não temos salva-vidas; pra cair, basta estar em pé; acidentes fatais são comuns etc. Só faltou dizer: “Muitos vão, poucos voltam”. Os que vi voltar (graças a Deus, fui um deles) se gabavam (menos eu) das picadas dos insetos, da falta de ar que escadas íngremes provocam, da topada na raiz da árvore centenária, remanescente da Mata Atlântica, do tornozelo, joelhos e coluna arruinados. O mais interessante de tudo é que a maioria da turma se mostrava devidamente recompensada pelo esforço.
Meu espanto com os ecoturistas é crescente. A única certeza que me dão é a de que jamais serei um deles. Eles não perdem nada com isso. Nem eu.