ANTONIO
Rua da Consolação, quase Piauí, perto do ponto do ônibus, era lá o boteco do Antônio.
Ele estava todo dia atras do balcão. Podia chover, fazer sol, calor, frio, o Antônio estava lá.
O Antônio que sabia de tudo. Conhecia todos os caminhos de São Paulo, onde entrar, como sair e pegar a estrada, como não pegar engarrafamentos, tudo...
E ainda tinha a melhor torta de frango da cidade. Era um japonês da Liberdade que trazia toda semana.
Eu entrava fim de tarde inicio de noite, e o Antônio já esquentava a torta de frango. Dependendo do tempo, acompanhava um chope, chocolate quente ou suco de laranja. Mas a torta era sagrada.
E a conversa rolava... sobre o tempo, o transito, a crise. Valia tudo e o Antônio como todo dono de botequim que se preza sabia de tudo, comentava qualquer assunto com a autoridade de quem está atras de um balcão e tem a obrigação de comentar e informar.
Ensinava acessos para a Dutra, onde não se pegava transito: - entrar na rua tal, seguir até o terceiro farol, virar à direita, ir em frente toda vida e virar à esquerda na rua Monsenhor não sei que, etc.
Eu fingia que entendia e dizia que na próxima viagem ao Rio iria por esse caminho. Nunca consegui acertar, mais a informação era quente...
Sabia que ele morava lá pros lados de Guarulhos e que fechava às 11 horas, então pegava a Brasília bege e se mandava pra casa, voltando no outro dia para abrir as oito. Tinha freguesia certa do Mackenzie e de um cursinho de computadores. Não podia deixar ninguém na mão.
Vida que segue, passei um tempo sem ir ao boteco comer torta de frango, um dia entrei e surpresa: outra pessoa atendia atras do balcão.
- Cadê o Antônio? perguntei.
-Voltou pra estrada, respondeu o outro. Troquei o boteco com ele por um caminhão, ele era caminhoneiro e não agüentava mais a cidade.
Perguntei pela torta de frango. Não tinha mais, o japonês era cunhado do Antônio, e deixou de fazer quando ele deixou o botequim.
Continuei passando por lá e esporadicamente tinha noticias do Antônio.
Estava em Goiás pegando frete, tinha ido pro Ceará etc.
Um dia o novo dono falou:
- Antônio vendeu o caminhão, não agüentou o tranco, a estrada tá muito perigosa.
Perguntei: - será que ele volta pro boteco?
- Não sei, respondeu...
Tempos depois passei por lá.
- Sabe o Antônio? Foi pra Osaka, a mulher dele é japonesa e ele foi tentar a sorte por lá.
Fiquei imaginando o Antônio em Osaka. Sem conhecer os caminhos, sem falar a língua, sem saber os costumes, a comida, tentando a sorte...
Como?
Será que no Japão também tem japonês que faz torta de frango?