NINA E O CALANGO

NINA E O CALANGO

Jamais me esquecerei daquele grito desesperado de minha mãe vindo de qualquer lugar me fazendo pular da cama, onde, às 17 horas e 30 minutos, aproximadamente, encontrava-me esticado de roupa e tudo: tênis, óculos...na cama de um quarto de sua casa, completamente destruído e esmigalhado, física e emocionalmente após ministrar cinco aulas de inglês e tomando coragem de ir pra minha casa encarar mais trabalho.

-Júliooo!!! Júliooo!!! Corre aqui!!! A Nina está com um bicho na boca!!!

Até eu codificar o final do grito de terror, já tinha pulado da cama, escorregado no tapete e dado uma cabeçada na porta – sabe aquelas cenas de desenhos animados que eles correm e não conseguem sair do lugar? Pois é. Desesperado:

– Mãe!!!...

Quando consegui sair do lugar, meio zonzo, cheguei até a sala, onde intuitivamente fui levado pelas ondas sonoras e dei de cara com a cena mais bizarra de toda minha existência mortal neste planeta sensacional: Nina estava paralisada na sala em estado de choque (com os gritos de minha mãe, possivelmente) com um calango enorme na boca. Dei uma freada que fez até barulho, fumaça e cheiro de borracha queimada.

- Nina, largue isso! – falei com voz firme e olhando nos olhos dela.

Foi o momento exato que ela me obedeceu prontamente correndo pela casa com aquele dinossauro na boca, minha mãe gritando e Conceição, coitada! Conceição é a acompanhante de minha mãe, mora com ela, ex esposa de meu irmão caçula que é mais da família que o próprio: se arrepiava e berrava “Ai, Júlio, ai, Júlio tira esse negocio da boca dela pelo amor de Deus!”. Foi o momento que ela tentou abrir as garras da nossa caçadora e libertar o réptil agonizante e ele, o calango, deu uma “cagada” no chão! Desvairada, Ceição saiu vomitando em direção ao tanque da área. Onde eu estava nesta hora dramática?! Contorcendo-me em um canto da cozinha quase me urinando de tanto rir e gritando “para, para eu vou me mijar...” Eu estava paralisado, se desse um passo sairia molhando tudo!

E nestes segundos intermináveis na eternidade, minha mãe, teve a belíssima idéia de abrir a geladeira e pegar um pedação de filé temperado e cru que estava esperando o jantar e mostrou para a Nina. Isso depois de um corre-corre danado pra lá e pra cá, a maior gritaria e Nina apavorada sem saber o que fazer... Conceição vomitando e eu me urinando, chorando e sem ar de tanto rir.

Nina largou o calango no chão, veio em direção do belíssimo filé, Conceição jogou um tapete em cima do pobre animal ferido e eu consegui sair daquele sufoco danado correndo para o banheiro sem molhar nada.

Nos recuperamos do momento dramático sentados nas cadeiras da mesa da cozinha, rindo, aliviados, bebendo água e observando a Nina comendo um filé pensando que era um calango. Essa cadelinha ainda me mata do coração!

Júlio Amorim
Enviado por Júlio Amorim em 24/10/2013
Reeditado em 24/10/2013
Código do texto: T4540680
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