Você é uma artista!

Eu sempre me lembro dessa frase e acabo rindo sozinha. A situação em que eu a ouvi foi tão inusitada que sempre acho graça.

Tudo aconteceu na época do lançamento do meu primeiro livro. Padre Gabriel, os irmãos Silva, Valdemiro e eu havíamos combinado de nos reunir e fazer uma Noite Cultural. Seria o momento de lançarmos dois livros (o de Padre Gabriel e o meu) e dois CDs (do Valdemiro e dos Irmãos Silva). O presidente da Câmara Dr. Ênio havia nos oferecido o espaço do legislativo para esse evento. A organização foi uma loucura. Corre daqui , corre dali, organiza isso, prepara aquilo e todos estavam com os nervos alterados. O simples fato de se envolver com esses acontecimentos, já é desgastante e, quando não temos uma equipe preparada para nos ajudar na organização, fica tudo muito difícil.

Tenho uma prima que diz: “Você é de áries! Arianos puxam o carro”. Acho graça quando ela fala isso, mas ao mesmo tempo percebo que coincidência ou não, é o que sempre acontece. Tento evitar, não gosto de me confrontar com ninguém, procuro ficar quietinha no meu canto, mas quando vejo já estou assumindo tudo. Por causa disso, estou sempre envolvida com muitas atividades e suprindo lacunas nos lugares em que eu me encontro. Desde o tempo de colégio, já era assim. Era eleita para líder, para secretária da sala, para comandar o pelotão no dia de desfiles cívicos e outras coisas mais. Apesar de minha timidez sempre me atribuíam essas tarefas.

Assim que terminou o evento, combinamos que no dia seguinte voltaríamos à Câmara para verificar se estava tudo em ordem e entregar as chaves para a pessoa responsável. O comentário de todos era sobre o sucesso do acontecimento e até lamentaram o fato do lugar ter sido pequeno para comportar todos os convidados. Alguns não puderam nem entrar no recinto. Todos estavam felizes, mas eu estava contrariada com algumas coisas que haviam fugido ao meu controle. Eles falavam que ninguém havia percebido nada, que estava tudo maravilhoso. Eu continuava demonstrando o meu descontentamento por achar que não falara bem, que havia ficado muito nervosa. Padre Gabriel e Valdemiro tentavam me convencer de que eu estava enganada, pois tudo havia transcorrido da melhor maneira possível. Em determinado momento, Padre Gabriel falou:

— Sabe o que você é?

Respirei fundo para me preparar para ouvir aquela resposta. Naturalmente devia se tratar de uma verdade nada agradável, pois naquele momento eu estava revelando o meu lado mais humano, as minhas fraquezas, o meu temperamento... Afinal, que viesse a crítica! Eu estava preparada e, na verdade, estava até merecendo. Olhei para ele e falei:

— Não sei...

Com bastante gravidade, ele disse:

—Você é uma artista!

Meu Deus, aquilo era tudo de mais agradável que eu poderia ouvir! Fui pega tão de surpresa que me limitei apenas em exclamar:

— Pensei que o senhor ia falar uma coisa ruim...

E o assunto morreu ali. Eu não falei mais nisso, mas poucas palavras foram tão consoladoras e tão agradáveis de se ouvir quanto aquelas...

Déa Miranda
Enviado por Déa Miranda em 22/10/2013
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