A PRIMAVERA SEMPRE RETORNA

Debruçada à janela, observo a noite, olhos fixos no asfalto molhado, onde são refletidas as luzes esmaecidas da praça. Por toda a extensão, a rua permanece vazia. Apenas um gato, faminto, se aventura a enfrentar o vento gélido que percorre a noite, vasculhando uma lata de lixo nas imediações.

O silêncio, de quando em quando é quebrado pelo deslizar de carros, velozes, transportando no seu interior passageiros de cujos destinos nunca ficarei sabendo. Momentaneamente me detenho pensando se estão indo ou vindo. A vida é sempre de idas e vindas. Ninguém permanece mais que um momento num só lugar. Mas há algo de peculiar em todos, atravessam essa rua silenciosos, contagiados da nostalgia do inverno.

O chão está atapetado de folhas caídas e meio submersas na água escura e lodosa do meio fio. Olho as árvores ao redor e sinto como é triste o inverno. Nenhuma só rama permanece florida. Apenas galhos retorcidos restaram da beleza das copas frondosas e verdejantes.

Os pássaros há muito não gorgeiam mais em seus galhos. Emigraram para longe em busca de aconchego.

Que angústia indefinível essa noite me traz! Como se fora saudade de alguma coisa não feita ou não vivida. Algo que não consigo distinguir ao certo se existiu, se me pertenceu ou não, mas que tenho certeza de haver perdido... Talvez seja a ausência da alegria primaveril. Mas ela virá. Tal qual a esperança, ela ressurgirá viçosa apagando para sempre a tristeza do agora. Quando a manhã chegar, o sol brilhará outra vez. Os pássaros retornarão e sua sinfonia será ouvida qual mensagem festiva anunciando a primavera.

Haverei então de debruçar-me novamente à janela, não para observar o asfalto molhado. Voltarei os olhos para a imensidão do firmamento onde as estrelas estarão sorrindo e sentirei, então, como é maravilhoso pertencer a este mundo, sentindo as suas alegrias e tristezas mas sempre com a esperança de que amanhã será outro dia. E ficarei pensando que talvez o amanhã que virá, poderá ser o começo eterno da primavera que todos sonham, um dia ver chegar!