O que deve ser a felicidade
Aconteceu de eu estar em Curitiba e precisar de um computador para trabalhar. Como estar na cidade também é, forçosamente, encontrar Marina, unimos as duas coisas e eu fui trabalhar em sua casa. Os quatro ônibus que precisei pegar para chegar lá não dão ideia da distância em que normalmente estamos durante o ano. Nem sempre foi assim, pois durante dois anos nos vimos todas as noites, e estávamos de tal forma próximos que aos outros pareceu que tínhamos um caso. Não tivemos – ela queria preservar a amizade. Mas não bastava negar, e houve um dia em que os outros, em zombaria, fizeram uma pequena vaquinha entre eles destinada a custear a nossa lua de mel.
Encontrei Marina recém-desempregada. Mas ainda ligavam para ela do seu antigo emprego pedindo ajuda. Conversamos um pouco, revimos a trajetória dos nossos conhecidos, e chegamos a conclusão de que sou mesmo o único que sumiu no mundo. Então fui trabalhar, mas o trabalho é tão chato e inútil quando se está com Marina que acabei desistindo. Conheci então o seu pai, que soube ser poeta e fã de Cecília Meireles. Falamos de Brasília e seus inacreditáveis ônibus de cordinha. E em seguida preparou-se um café da tarde, ocasião em que vislumbrei o que deve ser a felicidade.
É algo parecido com estar sentado em companhia de quem se gosta, sentir-se à vontade e sem grande timidez, ouvir uma história divertida de muito tempo atrás, conversar coisas domésticas, comer alguns doces, beber um copo de suco, ser incentivado a pegar mais, e realmente pegar, ter subitamente que sair da mesa para fechar as janelas porque ameaça chover, conhecer uma mãe que sempre ouviu falar muito de você, e por fim conhecer o próprio namorado de sua amiga, que calhou também se chamar Henrique, e perceber com alegria que ela fez mesmo uma boa escolha, e ao final do dia receber uma carona que devia ser só até o terminal, mas acabou sendo até em casa, e diante dela nos despedir com o mesmo abraço de anos atrás.