CENAS QUE ME EMOCIONARAM

1) BÍBLICA

Em 1983 eu estava com um colega auditor viajando pelo estado do Rio de Janeiro, fazendo uma pesquisa de campo. Escolhemos cidades que jamais alguém desconfiaria que pudesse existir uma auditoria, devido a estradas precárias e muitas delas nem asfaltadas eram. Muito calor em setembro acompanhado de uma longa estiagem. Olhávamos para os campos e víamos o calor castigando os capinzais, desidratando-os, pois víamos vapores incolores em nossa frente e não era diferente quando a estrada era asfaltada.

Dentro de um Omega (veículo da GM) equipado com ar condicionado, nada sentíamos e comentávamos o quão incômodo aquele calor nos estaria causando sem esse equipamento. E aí vimos uma cena que nos deixou emocionados, como eu gostaria de saber desenhar ou pintar para perpetuar numa tela essa cena. Será que saberei descrevê-la e emocionar o leitor.

Quase igual a esta cena nós vemos em filmes bíblicos: José puxando seu jumento num deserto escaldante e sobre o dorso do qual estão Maria e Jesus. Mas nós estávamos no século XX, numa estrada esburacada, com um estreito acostamento em terra e o que vimos foi:

Uma mulher com lenço sobre a cabeça, com um rosto castigado pelo sol, puxando um jumento e sobre o dorso do qual uma criança, um menino que não tinha mais que dez anos, segurando com a mão direita um bebê e na mão esquerda segurava uma sombrinha cor de rosa, bastante velha com alguns furos, fazendo sombra ao bebê. Ato contínuo, olhamos um para o outro e ele se expressou primeiro:

- Santo, sabe quando veremos uma cena dessas novamente?

- Nunca mais, disse eu. Sinto não ter uma máquina fotográfica para registrar. Esta é uma cena que me remete ao passado bíblico.

Meus olhos destilaram uma lágrima, se não estivesse num veículo com ar condicionado, certamente essa lágrima se evaporaria.

- Nossos filhos nunca verão uma cena dessas ao vivo, disse o meu colega. A gente tem que viajar por lugares simples como roça e sertão para ver coisas que muita gente não vai acreditar quando a gente contar. Que vida dura!

Passaram-se trinta anos e eu ainda me comovo quando me lembro desta cena. Sempre tive um coração mole.

2) ROMANTISMO RIBEIRINHO

Esta cena é mais recente, apenas oito anos se passaram. Eu e meu irmão fomos pescar no Rio Paraná uns quarenta quilômetros rio abaixo da ponte que liga a rodovia marechal Rondon com o estado de Mato Grosso do Sul. Nessa distancia ficava a pousada onde ficamos. Esse era um passeio que desde a minha adolescência eu sonhava em fazê-lo. Via aquelas fotos de peixes enormes (pintados, jaús e cacharas) quase do tamanho de um homem adulto e isso me fascinava. Depois de passar dois dias pescando e não pescar nada decente (apenas um piauzinho e uma arraia de um palmo de diâmetro), nós subíamos o rio para voltar. Eu estava feliz pois vira a natureza em festa: olhando macacos, muitas aves, pássaros pretos em bandos, cardeais, papagaios, araras, águias, gaviões, macacos (bugios) pulando de uma árvore à outra (um foi fotografado com uma Yashica de 25 anos e para isso fiquei olhando para o bicho quase meia hora e fui feliz, peguei-o entre uma árvore e outra), pena que não vi nenhum jacaré. Sinto-me um privilegiado, não entendo como há pessoas que nada sentem pela natureza e ainda a destroem matando, derrubando, desperdiçando. Eu nunca cortei uma árvore e pesco apenas o necessário, depois pesco sem farpa e solto. Esses são meus troféus. Sou ecologista desde criança. Fico tão empolgado que tinha me esquecido de continuar a crônica.

Voltava olhando para as duas margens, mas que eis a cena que me chamou a atenção. Passamos por um barco no qual estava um casal idoso, ribeirinhos, sob um guarda-sol velho e esburacado pescando abraçados. O velhote com o braço esquerdo sobre o ombro da sua amada, tão absortos que nem olharam para o nosso barco quando passamos por eles apenas uns dez metros de distância. Essa cena eu fotografei. Quando a gente está feliz, vê amor em tudo. Naquele momento eu vi que o amor existe nas mais simples coisas. Adoro ver “pombinhos” dessa idade!!!

SANTO BRONZATO em 02/10/2013.

SANTO BRONZATO
Enviado por SANTO BRONZATO em 02/10/2013
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