DE MÉDICO E DE LOUCO.
                                                              
                                           É impressionante o fenômeno que se tem observado com o aumento da possibilidade de divulgação da informação e que surgiu com a derrocada do monopólio de ditaduras civis e religiosas que se utilizaram do conhecimento para adquirir e manter o poder sobre a grande massa desinformada. E isto em todas as civilizações, ao longo da história da humanidade.

                                             Embora, no Ocidente, tenha iniciado com o “Renascimento”, a popularização do conhecimento somente se tornou possível com o advento de poderosos instrumentos como a imprensa e, mais, recentemente, as redes sociais. A Revolução Francesa foi viável pela existência da mídia impressa, incipiente na época, mas poderosa o suficiente para incitar os oprimidos a alcançar o objetivo já amplamente dissecado pela história.
                                           O conhecimento científico, entretanto, continuou, por séculos, a ser um privilégio de poucos, não por acaso, mas por interesses econômicos: a mola mestra, tanto da pesquisa, quanto da reserva do conhecimento foram usados como instrumento de dominação, amparados, evidentemente, pelo poder econômico.
                                           As redes sociais tornaram-se um instrumento maravilhoso de democratização da informação, abalando seriamente o grande poder adquirido pelos meios de comunicação tradicionais. O acesso às informações, ainda que restrito a uma ainda pequena parcela da população, está mudando de forma inexorável o futuro da humanidade. Não me arrisco a prever qualquer futuro, mas, tendo algum conhecimento da história, não duvido que seremos, como sociedade, melhores, a cada ano que vier.
                                           Entretanto, essa facilidade na informação, ainda que extremamente positiva e inexorável em seu avanço na evolução do ser humano, guarda algumas armadilhas. Aliás, tais armadilhas fazem parte de todo o processo de evolução pelo qual passou a humanidade.
                                           Minhas apreensões derivam de algumas percepções da realidade, ainda que parciais, face à minha condição de ser limitado no acesso à massiva fonte de informações que me chegam a cada dia, face à dificuldade de  poder de checá-las, como também à certeza de que uma grande parte está sendo manipulada por interesses que não atendem ao que aprendi na Faculdade de Direito como “o bem comum”, que deve se sobrepor ao interesse pessoal.
                                           Assim é que traço algumas considerações passíveis de justificar minha ansiedade com algumas questões pontuais (não muito filosóficas, mas pertinentes ao determinado momento de nossa história – ou, mais especificamente, da “minha percepção da história atual”).
                                           Apenas quando cursei a Faculdade de Medicina (isto lá nos idos dos anos 80) é que pude avaliar em parte a profundidade do dito popular de que “de médico e de louco todo mundo tem um pouco.” Isto está tão arraigado na crença popular que, não raro, leigos teimaram em discutir comigo a causa e/ou o tratamento de diversas doenças, ainda que sabedores de minha formação médica.
                                           Na grande maioria das vezes, as idéias deles baseavam-se em crenças já demonstradas como equivocadas pela ciência moderna, mas continuavam como verdades absolutas, trazidas de um aprendizado de longa data e transmitidas à maneira antiga, como ensinamento dos antepassados. Eu mesmo, ao cursar a faculdade, tive que desmistificar crenças que eram verdadeiros absurdos, mas que, até então, eram a mais pura verdade, sedimentada por séculos de “conhecimento”. Aliás, o século vinte foi o maior destruidor de “verdades”, fruto do aprimoramento do método de raciocínio e da técnica de pesquisa, que, em última análise, é resultado do avanço fantástico da ciência neste período. Lamentavelmente, passados mais de trinta anos, ainda ouço, até mesmo de ex-colegas afirmações que já eram absurdas naqueles tempos de residência na Santa Casa (há longínquos 34 anos).
                                           Uma apreensão especial me domina: o quanto há de verdade em pesquisas cinetíficas divulgadas? Todos sabemos que uma pesquisa científica implica em despesas pesadas e, muita vezes, sem resultados esperados (sem vantagens econômicas, portanto). Quantas vezes há pequenos, mas definitivos, “dados desprezados”, para que a pesquisa alcance o fim pretendido pelo financiador?
                                           Como sou otimista, creio em dois sentimentos humanos, que, embora antagônicos, colaboram para que a fraude em pesquisas científicas na área médica seja uma parcela ínfima: Primeiro, um sentimento nobre, de preservação da espécie, extremamente forte, aliado a uma motivação que nos diferencia, como seres humanos: a consciência da honestidade; e um outro sentimento, menos nobre, mas igualmente importante, o da vaidade; o sentimento que nos faz sentir superiores aos demais. O sentimento que nos faz trabalhar até ganhar o Prêmio Nobel. A distinção, o desejo de sermos diferentes e, por conseqüência, merecedores da atenção de nossos pares; a alimentação da alma, a vida, por direito.
                                           Mas estas mazelas não são exclusivas da área médica. Elas fazem parte de todas as áreas do conhecimento humano. A ciência avança, explicando a vida, contrariando religiões e crenças.
                                           Ultimamente, tenho me surpreendido com a incursão audaciosa da mídia impressa, que tem contratado “cronistas” com a missão pretensiosa e absolutamente leiga de traçar comentários sobre antropologia, sociologia, psicologia, etc., tendo em seus currículos o título de “Bacharel em Ciências da Comunicação”. Alguns, nem este título possuem, mas se arvoram ao direito de tratar do comportamento humano em suas colunas. Assustam-me as besteiras que dizem em veículos de intensa circulação!
                                           Indignação me ocorreu quando a classe corporativista fez campanha para que somente pessoas com diploma em “Bacharel em Comunicação” pudessem atuar como jornalistas!

                                             Para escrever no jornal, precisa ter diploma de jornalista, mas para tratar do comportamento humano, nada é exigido! E vão jogando por aí crenças sem qualquer fundamento científico, apenas baseadas em suas vivências pessoais.
                                           Hipocrisia, ou pretensão de poder?
                                           Na esteira, segui a regra: escrevi estes comentários não científicos. Não sou jornalista, nem psicólogo, nem psiquiatra, nem sociólogo. Quem tem poder para recriminar minhas observações dos fenômenos da vida?
Nelson Eduardo Klafke
Enviado por Nelson Eduardo Klafke em 30/09/2013
Reeditado em 01/10/2013
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