O lamento de um vovô
Queria voltar ao tempo em que minhas crianças tinham sede. No tempo em que tinham fome. Não de água e pão. Não de arroz e feijão. Mas fome de brincar. Saudades do tempo em que o pião, a pipa, os carrinhos de rolimã e a bola de futebol não eram apenas brinquedos e sim amigos inseparáveis da molecada. Bolinhas de gude, pique pega, esconde-esconde...
Hoje são lembranças... Lembranças de um tempo em que mesmo com as dificuldades e provações da vida nunca deixei um pranto durar no rosto de uma criança. Hoje eu, velho arqueado, de voz baixa e um olhar triste vejo no presente um futuro de tempos escassos. Escassos de afeto, escasso de carinho, escasso de amor... Um verdadeiro lamento desse velho que com lágrimas nos olhos clama por mais amor. As crianças tentam ultrapassar o seu tempo, pulam etapas e deixam de descobrir como a vida é, afinal para isso que as brincadeiras servem: ensinar. Ensinam no esconde-esconde que no momento em que estamos de olhos fechados contando depressa para o tempo passar e acharmos todos que brincam, que se não for o tempo não sairemos do lugar. Ensina que há momentos em que vamos olhar ao nosso redor e não haverá ninguém para nos ajudar, mas que se dermos o primeiro passo poderemos achar alguém, e esse alguém nos ajudará a encontrar os demais, a achar uma saída para um momentos de angústia. Empinar pipa nos ensina que devemos sempre estar nos ajustando as condições de determinado momento: uma hora fazemos força para nos mantermos no alto, ou de pé, em outro o vento nos leva de tal forma que precisamos apenas nos manter inertes. Jogar futebol nos ensina que teremos momentos de ganhar e de perder, e que um momento o juiz apita o final do jogo. O jogo acaba, mas as pessoas continuam. Entendeu? Um jogo, apenas um jogo.
O jogo mais importante: a vida. Cheia de altos, baixos, calmos e agitados. Tristes e alegres. É isso que as crianças perdem queimando uma etapa de sua vida... O aprendizado de que primeiro vós são embalados por suas mães, após começa a dar os primeiros passos, andam, já adultos correm, no meio do percurso cansam e voltam. A medida que o tempo passa se ocupam de tal forma e se esquecem de tudo, afinal, está muito ocupado para enxergar. E quando tudo parece ter dado errado, pensam: “como eu queria voltar a minha infância”...
Por fim tentam recuperar o tempo perdido, mas já é tarde... O tempo passou... E as vezes, crianças tem de ser apenas... Crianças...