ONDE FICAM AS EMOÇÕES?

                                  Quando jovem, fui atormentado por um pensamento que não me abandonou por muitos anos: onde está o amor? Sempre soube que o amor estava abrigado no coração, mas, ao dissecá-lo numa aula de anatomia, nada encontrei. Disfarçadamente, andei espiando os corações dissecados de meus colegas e nada vi de diferente do que já havia visto no meu. Músculos, artérias, veias, mas nada que me desse uma pista sobre a localização do amor. Talvez fosse como Atlântida ou o ponto “G”, pensei: dizem que existe, mas ninguém jamais conseguiu vê-los. E a tristeza? Também me disseram que ela estava no coração, mas o exame anatômico nada me revelou. Balela, refleti. Outro engodo, feito Papai Noel, coelhinho da Páscoa, saci pererê, mula sem cabeça e tantas outras mentiras que me impingiram na infância. Minhas buscas anatômicas quase se encerraram definitivamente quando não encontrei a maldade ao dissecar o fígado.
                                  Um fio de esperança ressurgiu quando começaram as aulas de anatomia neurológica. Contrariando todas as rígidas ordens dos mestres e arriscando ser preso, escondi na mochila um cérebro formolizado e levei-o para casa, com o intuito de estudá-lo sem pressa, à cata das emoções. Dias e dias depois, nada! Afora o horror (que é um sentimento) de minha família ao ver o cérebro no refrigerador, a frustração foi derradeira. A anatomia era uma coisa definitivamente estática demais.
                                  Uma nova esperança tomou conta de mim com as primeiras aulas de fisiologia. À medida que avançavam os estudos, novas frustrações iam se acumulando.
                                  O golpe final aconteceu próximo ao fim do curso, quando o grande mestre de patologia nos ensinou que o mundo poderia ser explicado por uma nova ciência que surgia: a cibernética. Desisti, jamais descobriria onde estava o amor, a tristeza, a raiva, a alegria e o medo.
                                  Depois disso, estudei filosofia, sociologia, história, política, direito, psicologia, astrologia, bruxaria e até escatologia. Tudo para poder satisfazer minha curiosidade de saber por onde andavam minhas emoções. Nada descobri. Experimentos atuais tem demonstrado que algumas regiões do cérebro estão associadas a determinadas emoções, mas isto já não me interessa mais: descobri que todas as emoções estão na Poesia.
Nelson Eduardo Klafke
Enviado por Nelson Eduardo Klafke em 26/09/2013
Reeditado em 10/10/2013
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