O MENDIGO
No período em que trabalhei a noite, em muitas madrugadas presenciei algo que jamais esquecerei...
Existe um homem em minha cidade, um cidadão do mundo, como tantos. Como todos nós!
Parávamos sempre em algum canto para a famosa saideira.
Acontece que enquanto eu me afogava em goles generosos de cerveja e me inebriava com perfumes baratos ao redor, eu sempre o observava. Em todo canto, em cada esquina.
Ele sempre perambulava aqui e ali. Um solitário... Um mendigo do mundo. Apenas mais um!
E ele desenhava tudo que via.
Já desenhou a mim e a tantos outros rostos anônimos.
Mal conversávamos e ele nunca pediu qualquer coisa...
Ele era como uma alma invisível carregando sua pitoresca prancheta envelhecida como sua própria vida.
A noite, mais que estrelas, é composta de fantasias e dores.
cheiros...mal cheiros
Encontros e desencontros
Almas generosas e outras pavorosas...
A noite é um picadeiro repleto de personagens.
E este homem era mais um...
Mas o que me move a contar isso são seus desenhos!
Eram horrorosos (talvez até retratassem o que nunca queremos ver) com traços trêmulos e sem cor alguma.
Impossível reconhecer algo naqueles papéis mal cuidados.
Mas ele via!
E saia feliz com seus desenhos feios a tiracolo.
Ele nunca vendeu uma caricatura sequer... Nem nunca uma paisagem.
Ele não pedia que ninguém comprasse. Não pedia nenhum elogio
Ele não pedia nada!
A ele, bastava a certeza do que fazia. Seus olhos brilhavam de satisfação própria. E seu sorriso, invariavelmente de canto, se escancarava de felicidade!
Hoje não trabalho mais a noite. Eu nunca mais o vi.
Mas com esse mendigo eu aprendi a melhor das lições.
Uma que a escola não ensina e que a vida só o faz sutilmente, através dessas pequenas almas invisíveis...
“eu aprendi que o sonho da gente é único. E que não devemos esperar que ninguém sonhe por nós”