Homenagem à nossa natureza.

PANDUÍ.

Êta rio formoso que me deu tanto alegria. Foram em suas águas que fiz tanta folia. Nadando de braçada naquela represa sentia-me diante de uma realeza. Naquelas águas (tempos atrás) tinha uma usina de energia elétrica. Era algo monumental para a época. Só que eu não dava importância para esse feito, pra mim isso era coisa de Prefeito. Não era o melhor de tudo. O que valia, para mim, eram as águas abundantes que me conduziam às proezas inebriantes. Elas lembram sobre as minhas andanças do tempo de criança quando eu caminhava horas a fio para chegar naquele rio.

Era pura traquinagem na busca da minha liberdade. Eu saia de casa numa fuga de meia-tarde, a pé ou de bicicleta, ia sob linha reta, até chegar no matadouro onde tinha o cheiro de couro; era, talvez, minha estreia (como calouro). Queria chegar o mais rápido que podia, para voltar ainda de dia. Mas, o melhor mesmo; era a farra, com a turma que me acompanhava. O desvio era inevitável, por aquela estradinha de areia, que acabava levando ao encontro de algumas sereias. Aquela zona de alta frequência levava a gurizada á demência. De repente aparecia uma beldade quase sem roupa, conspirando contra minha vontade. Ela exibia um sorriso matreiro e perguntava se alguém tinha dinheiro. Aí vinha o desespero! Não adiantava ficar para farra, porque “grana” não era coisa que a gente carregava!

Assim, a caminhada prosseguia apesar da frustração. Aquela ainda não era coisa para nossa geração. Mas a chegada ao rio era triunfal. Para mim não existia nada igual. Era como nadar num mar de águas de sal. Ou melhor, não eram águas salgadas e sim águas geladas, que se estendiam num vasto canal. Entre o cansaço e um suspiro eu vivia o momento colossal. Ouviam-se os ruídos que pareciam estampidos. Era o barulho da cachoeira exigente que balançava o coração da gente!

Era hora de despir-me das roupas poeirentas que ficavam no chão. Logo eu exibia o calção de náilon - tão frouxo - com alguns traços de roxo. Atirava-me com tudo num pulo indomável e me arremessava nas águas naquele mergulho profundo com se fosse desvendar os mistérios do mundo. Com braçadas ligeiras ouvia os alaridos e os gritos que vinham em coro. Era uma torcida demente que se movia desafiante, tripudiando minha conduta por se jogar sem nenhuma consulta. Às vezes alguém caia - machucando o corpo - mas nada disso era obstáculo para interromper o espetáculo. Era a alma que brincava naquelas águas turvas. Era o corpo que era mais forte que o perigo!

Foi um rio que banhou nossas vidas. Suas águas levavam nossos pais a se aproveitar de nossa ingenuidade. Sob pretexto de um bom banho a gente se afastava da cidade. Topava dar um banho nos jipes nem se alguém estivesse com gripe. Não existia coisa melhor do mundo do que levar aqueles carros que sempre estavam imundos. Os jipões desciam tracionados. Alguns até ficavam atolados. Mas não havia dificuldade, tudo era resolvido com simplicidade; aos empurrões e gritos os carros barulhentos iam se livrando da lama e nós ficando com a fama. Eram os garotos que se afundavam nas águas e venciam suas correntezas através de tantas proezas.

Hoje tudo se apagou. Só nossa memória ficou de um passado distante. Nada é mais como antes. Tive grande desgosto ao ver nosso saudoso Panduí. Suas águas sumiram. Evaporaram-se nos tempos. Tudo passou como o vento. Os homens destruíram seus encantos com sua sede de ganho. Tudo não passou de um sonho de infância. Talvez seja a ganância. Não sei bem! Talvez o ouro não valha um vintém! Não é justo fazer isso com a natureza, destruindo nossa represa. Já é hora de despertar e acordar desse pesadelo. Nossas águas merecem nosso zelo. Vamos preservar o que ainda temos, porque não vale a pena viver do passado. Precisamos pensar em quem esta sendo gerado. Vamos esquecer nossos arados. Parar de descerrar os cerrados. Assim vamos evitar o fim de tantos Panduís que tivemos o desfrute de vivenciá-lo quando fomos guri.

Machadinho
Enviado por Machadinho em 18/09/2013
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