Sobre livros medíocres e brinquedos fedidos.
Insistentemente ele dizia:
- Eu quero o livro, eu quero o livro!
E isso era proclamado aos quatro ventos, na livraria do shopping.
- Mas, se eu te der esse livro não vou mais comprar o brinquedo! – a mãe ponderava em voz constante e sorrateira.
Era noite de sábado e a livraria do shopping estava lotada, uma vez que o final de semana era de sol e a cidade litorânea nesses dias sempre fica lotada de paulistanos que a ela acorrem em busca da grande extensão de água salgada, o mar. As pessoas ao redor olhavam disfarçadamente para mãe e filho e como plateia de um octógono aguardavam o desfecho daquele duelo.
- André, decida se quer o brinquedo ou o livro! – repetia a mãe, tentando influenciar o filho a escolher o brinquedo. Daí então ressoa estridentemente o brado do pequeno, como um alarido de liberdade e desejo de gente grande:
- Eu não quero esses brinquedos fedidos que você compra! Eu quero o livro!
A progenitora dirigiu à sua cria um olhar terrorista e só então percebeu que era o centro das atenções do público leitor e, para que não a ouvissem, pronunciou palavras suaves e sibilantes:
- Chega! Agora vá lá pra fora com seu pai, pois você não vai ganhar nada...
O pequeno arregalou os olhos, formou um belo bico e respondeu:
- Sua feia! - e chutou a canela de sua mãe, o que com certeza doeu mais nos nervos que na própria perna. Em seguida, capturou o pai que estava sentado no banco do lado de fora da livraria e começou a corteja-lo, tentando convencê-lo a dar-lhe o livro. O chefe da casa, por sua vez, formou uma cara impaciente e respondeu preguiçosamente:
- Você sabe que eu não entendo de livros. Não me peça nada! Vai pedir pra tua mãe.
Ao André, restou o desconsolo e a tristeza de não ter o livro almejado e talvez o brinquedo fedido que apenas o distrairia por algum tempo, mas não lhe abriria as portas do conhecimento e mundo subjetivo que há em cada ser. Os pais continuaram o passeio satisfazendo seus gostos.
E depois ficam pó aí filosofando pra saber por que as crianças e adolescentes não leem. Talvez seja por que os pais proferem dar brinquedos fedidos quando vão ao shopping e desprezam os livros “medíocres” de literatura infantil.