Eu, o Cazuza e o careta ortográfico

Não aguento mais esses caretas ortográficos. Vou me mudar para a lua!

Eis que, em uma segunda-feira dessas sem importância alguma, sou surpreendido, em um boteco, por um belo exemplar de careta ortográfico.

O cara corrigiu um poema do Cazuza. Na lata. Eu com o coração sangrando, o rosto arranhado, o fígado já pela metade e a cabeça decepada, caída perto do lixo.

"Ele errou no pretérito do perfeito", algo assim.

Exato como uma calculadora científica. Frio como pedra.

Parecia um daqueles mensageiros macabros, responsáveis por trazer a má notícia; "você vai morrer", "só tem duas semanas de vida", "sua mulher fugiu com o motorista".

É isso que um careta ortográfico é; o portador de convenções malditas.

O que há com o Brasil?

O que há com os brasileiros?

Não podemos nem sentir uma dorzinha de cotovelo poética em uma esquina qualquer da solidão, sem ser repreendidos por um careta ortográfico armado com seu cassetete de regras e acordos desinteressantes?

"Me deixe morrer aqui, seu careta. E vá chupar uma rola bem grande!".

Eu pensei. Mas não falei.

Fiquei com medo de errar na concordância gramatical, na coerência verbal ou na associação poético-ilusionista.

O Cazuza não era professor de português.

E é uma pena ele ter morrido.