Os cabarés de Camaragibe
Desde que o mundo é mundo a profissão de prostituta existe. A sociedade sempre olha as putas de viés. Mas, elas existem. Estão lá e quando destroem os prostíbulos elas emergem das casas de todas as classes sociais. E parafraseando Falcão, a sua filha pode estar aqui dentro.
Muitos anos atrás, existiu lá no bairro Timbí, um recinto destes chamado de O cabeçudo. Eu não sei o porquê do nome. Sei que era uma estrutura interessante, pegava uma boa parte da esquina. Atravessando de um lado a outro com espaço imenso repleto de mesas e cadeiras. Minha Bisavó Dona Iaiá residia bem ao lado. E meu avô Euclides, ou Ôcrido como muitos chamavam tinha um bar logo abaixo. Confesso que tinha um fascínio enorme por estas mulheres. Pelo jeito delas de estar sempre a conquistar. Tratavam-me com um misto de sedução e carinho quando eu estava atendendo na barraca. Uma cena que me marcou imensamente foi uma vez que assassinaram uma delas. Mataram e desovaram o cadáver por detrás do Supermercado Joia, hoje Igreja Universal. Uma negra, até bonita. Eu criança fui levado pela curiosidade e fui olhar. Estava lá. Nua, com seus excessivos cabelos púbicos à mostra. A perícia estava tentando desvendar quem havia feito aquela maldade tremenda com aquela mulher. Enviaram uma garrafa de bebida em sua vagina. Qual monstro de insustentável misoginia faria aquilo?
Era comum se escutar ali perto as canções tocadas na radiola de ficha. Uma vez eu dei um jeito de entrar lá. Era uma máquina enorme. Como os nomes das músicas digitadas na datilografia. Deveria hoje ser peça de museu. Lembro que elas eram românticas. E adoravam as canções da Roberta Miranda. Extremamente criativas na decoração e certa vez fizeram um lustre com copos de plástico.
Sempre havia brigas, discussões e polícia. Ficava com o coração amargurado quando passava e via uma senhora daquelas chorando. Tentava imaginar que desgraça tinha lhe caído sobre os ombros. Qual inferno seu mundo tinha se tornado.
Certa vez passando pela frente, um colega meu, bêbado, entrou no local e com cinquenta centavos bateu no balcão pedindo uma cerveja e uma acompanhante. Risos geral, paguei apenas a cerveja, visto que a garota ainda não havia sido contratada. Paguei a conta e carreguei-o de lá para evitar maiores conflitos.
Conflito é a palavra que nesses locais é o que não falta. Onde se misturam sexo, desejo e dinheiro nunca haverá consenso e harmonia. Dizem que em Alberto Maia estes espaços ainda existem. Sei que falavam que tinha um bar que se chamava Cadeado. Justamente para que pessoas inconvenientes não entrassem e as de dentro não saíssem sem pagar. Havia também o famoso O pimentão, que pelo nome havia de ser bastante “caliente”. Uma vez me disseram que perto da linha de trem, um lupanar destes que tinha como dono um senhor que ficava na porta controlando a entrada e saída das pessoas. Inclusive o horário de utilização das profissionais. Não sei qual o motivo, mas o mataram. Deram-lhe vários tiros.
Não sei se haverá espaço para o puteiro no futuro da cidade. Aquele lugar está sendo tomado por vários condomínios e prédios. Talvez eles acabem. Não por algum decreto. Mas, pela questão econômica mesmo. Talvez seja mais lucrativa uma padaria, por exemplo.
Sei que as quengas, como também são chamadas de forma pejorativa, está no anedotário brasileiro de forma diversa e múltipla. Dizem que o puteiro, apesar da cafetinagem ser proibida, é o único tipo de comércio no qual o produto é vendido e depois volta para prateleira. Hoje escutei uma de um amigo que trabalha comigo: _ Estou mais liso que rapariga de resguardo. Gargalhadas. Coitada das profissionais que como acidente de trabalho, engravidam. Como adivinhar a paternidade? Será que elas tem férias remuneradas, 13° e podem fazer greve? Registro aqui o importante papel de uma entidade chamada AME na proteção dos direitos das profissionais do sexo.