ASSOMBROS COTIDIANOS.
Quando penso que de minhas lágrimas já bem distante me encontro.
Ói, elas!
Elas, como sempre chegando, sem que importe à hora ou lugar, banham-me o rosto às vezes suavizam-me a alma.
E em outras meu pensar tal qual àquelas em jorros desemboca na apreciação das causas que me fazem calar.
Hoje me são mais abundantes que ontem, pois já não proveem de meros sentimentalismos, por se haverem tornado – Um manifesto tácito ante os assombros cotidianos da vida:
É fome,
A cocaína em cápsulas no estômago;
Crianças no lixo,
Políticos no luxo;
É a ignorância rebelde
A cultura da intolerância;
Um rato gordo no portão;
Mais uma moto no asfalto;
Vidas por um fio;
A pendura realizada por cartão;
É o vilão bolinando o filho;
São águas de março findando o verão;
O arrastão no condomínio;
Os não sabem o que diz;
É verme espancando ancião;
Tiroteio no morro;
Turista pagando pra ver;
Torcida fiel tal qual gang;
São bêbados se equilibrando no volante;
O assalto do ônibus;
O doente moral
A desconstituição do compromisso;
O sexo nas rodas
As grades altas do meu portão;
É o medo;
É a sangria do lastro
E as mortes sem leito;
São jovens assaltando o banco;
É a hipocrisia;
A falta de educação;
O devassar da nação;
O abandono na calçada
O abrigado pelo frio;
Mais um não;
O porco comendo a merenda
São os amorfos da corrupção;
A angústia invadindo a multidão;
É o resgate do sopão;
É a gente;
A vida;
O fim...
Certamente, que não!
São, só, minhas lágrimas, desaguando emoção.