Na suíte de Bach
Vindo de noites mal dormidas, aproveitei a terça-feira para acompanhar a apresentação da Orquestra Sinfônica aqui em Brasília, querendo com isso não apenas ouvir boa música mas também relaxar e – confesso – talvez até dar uma cochilada. Verdade é que eu não teria me decidido a ir se não soubesse que Bach estava no programa. Sou o tipo de pessoa que sempre cita a frase de Beethoven: “Um herege se converte ouvindo Bach”. E acrescento alguma minha também, como “Gênio é quem fez algo há 300 anos e ainda não foi superado”. Assim sou eu em relação a Bach. O que não significa que eu entenda alguma coisa de música. Entendo mais de mecânica quântica do que de música. Mas ouço, e aprecio.
Minha história com Bach começou quando eu estudava pro vestibular. Havia lido em algum lugar que música clássica, especialmente a barroca, era ótima para se ouvir durante os estudos. Por sorte havia lá em casa toda uma coleção de música clássica, brinde de alguma revista. Selecionei Bach e Vivaldi e pus pra tocar. Senti-me imediatamente contemporâneo aos dois. Tenho uma alma do século XVIII. Não sei, foi meio que uma reconciliação comigo mesmo, com minha maneira de ver o mundo, com as gerações que vieram antes de mim. Conheci então Bach, mas creio que ele não teve culpa por eu não ter passado no vestibular.
Assim, quando soube que a orquestra ia tocar Bach, eu estava preparado para uma catarse. Começou então uma suíte de Bach. Confesso que, àquela altura da noite, o que eu mais queria mesmo era uma suíte. Mas eu não dormiria durante Bach. Havia outros nomes no programa. Nomes que eu nunca havia ouvido falar, mas aparentemente eu estava em melhor situação que a maioria da plateia – ela ainda aplaude ao fim de cada movimento. Ouvi com atenção e evoquei as mesmas sensações daquele tempo. E desisti absolutamente de dormir quando comecei a reparar na encantadora chinesa que tocava o segundo violino. Mulher consegue roubar a atenção até durante Bach. Arremaria!