UMA INESQUECÍVEL AULA DE MATEMÁTICA
Década de 80. A empolgação do retorno ás aulas depois das longas, ou nem tanto, férias escolares, geravam uma alegria descontraída na garotada, ainda mais que haviam deixado o primário, que era só para crianças, e estavam no ginásio, 5ª série, já passavam para categoria de mocinhos e mocinhas.
Se soubessem o que lhes esperava, era melhor não terem crescido e ficado no primário mesmo.
Segundo dia de aula. Primeira aula do dia. Aula de matemática. Segunda aula de matemática da semana. A professora chega incomodada com a algazarra da conversa animada dos alunos, que ainda contavam aos colegas as aventuras e peripécias das férias.
Ela chega e brada:
- caderno na mesa! vou conferir os exercícios de casa da aula de ontem!
Silêncio geral.
Um mocinho que sentava no fundo da sala, engoliu em seco, arregalou os olhos e ficou com aquela cara de quem faz "arte".
A professora passava mesa por mesa olhando os cadernos.
O mocinho começa a se contorcer na cadeira. A professora estava chegando cada vez mais próximo de vistoriar o seu caderno. O medo começou a tomar conta do pobre garoto, indefeso, sem desculpas. Ele no ritmo de férias ainda, fez a arte de não fazer o exercício.
Simplesmente havia esquecido, completamente. Provavelmente foi jogar bola no "campinho do Gastão". Ou quem sabe foi brincar de "pega-pega" ou de "esconder", ou de "soldado fugido", ou foi pescar ou era caçar passarinho lá na "voltinha"?
O garoto nunca foi relapso em seus afazeres, até era considerado um aluno bom. Não era da classe dos estudiosos, mas também não se enquadrava na classe dos "vagabundos". Ficava num nível intermediário, mais próximo dos estudiosos. Isso claro, na percepção dele.
Ele nunca teve problema com aulas de matemática, não tinha dificuldade em resolver e entender as questões. Com outras matérias também não tinha dificuldades, só com educação artística. Não gostava e não tinha nenhum dom para as atividades, até para pintar os mapas exigidos pela Irmã Eliza para as aulas de história, se tornavam um tormento para ele.
A professora séria e sisuda chegou, olhou aquele caderno com os exercícios em branco e esbravejou:
- vai lá pra primeira carteira, e como castigo por não ter feito o exercício, ficará de pé a aula inteira!
Ele ficou quieto, sem reação. Se antes já não era de falar e nem fazer perguntas, agora de vez que daquela boca não sairia sons.
Todos os alunos sentados, ele de pé ao lado da carteira cabisbaixo. Seu rosto vermelhou de vergonha no início, depois ficou amarelo, pálido. A cabeça não mexia nem para olhar para os lados.
Interminável aula. A hora não passava, os minutos deixaram de existir, os segundos não queriam se mover no ponteiro do relógio, pura pirraça.
E como copiar a matéria que a professora passava no quadro negro, enquanto se esta de pé? Tortura! A letra virou garranchos indecifráveis. Deve ser por isso que a letra dele é horrível hoje? A caligrafia nunca foi o forte do mocinho, os vários cadernos de caligrafia utilizados no primário não conseguiam endireitar e adequar os garranchos em apresentáveis e decifráveis letras.
A aula terminou. A professora saiu e foi dar aula para outra turma. O mocinho ficou de pé.
Alguns instantes depois, os colegas pediram para ele sentar. Outra aula iria começar.