"VAI COMENDO RAIMUNDO" (e “o salário óhhh”!)
Em meio à rotina escolar, um aluno me chama de pai. Todos os dias, sem falta, ele insiste em me pedir a bênção. Seus pais verdadeiros não se incomodam, nem eu. Afinal, a escola é o seu segundo lar, e eu, por consequência, me torno seu segundo pai. O professor de matemática, por sua vez, torna-se um de seus tios. Não porque compartilhamos o mesmo sangue, mas porque ele também é professor dele. Em alguns momentos, sinto-me honrado, e acredito que o aluno também.
A professora de geografia, por outro lado, não é a favorita dele. No entanto, outros alunos a consideram a mais bela de todas as trabalhadoras ali: pequena e delicada, mas feroz quando necessário. Ela se faz grande diante de sua classe. Certamente, ela não tem inimigos ali, mas os acidentes têm sido uma constante, destacando a dureza da profissão. Uma vez, um aluno acidentalmente atingiu seu rosto, causando-lhe um olho inchado. Em outra ocasião, durante as brincadeiras do recreio, uma borracha foi lançada com tanta força que atingiu sua perna direita, fazendo-a encerrar sua tarde letiva naquele momento.
Por vezes, me pergunto quem é o santo padroeiro dos professores. Deve ser um santo tão desequilibrado e descuidado quanto eu, padrinho da turma do nono ano "B". Eles se vingam de si mesmos por tabela: um suicídio ideológico. Penalizam seus professores como se fosse um esporte, fazendo-nos sofrer em suas "abençoadas" garras. Até os momentos bons são frutos do cansaço daqueles que nunca nos dão trégua. Estamos tão desacostumados de boas e sadias relações, que até elogios da parte deles, vemos como tentativas de nos enganar! Então, no trabalho, andamos e falamos como quem pisa em ovos; é impossível não quebrá-los.
Eles, os intermediadores do conhecimento, querem aprender através de métodos que eles mesmos escolheram! E assim vai: "vai comendo Raimundo", como dizia o personagem do finado Chico Anysio, na Escolinha do professor Raimundo. E o salário, óhhh! E "vai comendo..." só no sentido figurado, pois o lanche da escola é só para os alunos; os professores, se tocarem, são considerados transgressores. Nesse particular, os alunos não precisam de exemplo e continuarão jogando arroz nos colegas.
No final das contas, somos todos parte de uma grande família disfuncional, aprendendo e ensinando uns aos outros, tropeçando e levantando, rindo e chorando. E, apesar de tudo, não trocaria essa experiência por nada. Pois, no final do dia, somos todos professores e alunos, aprendendo as lições mais importantes da vida: resiliência, empatia e, acima de tudo, amor.