Igrejinha

De vez em quando eu levo minhas tristezas para passear em meio às superquadras em Brasília. São prédios residenciais, condomínios mesmo, mas sem nada que impeça a passagem de um intruso como eu. Hoje em especial eu caminho pelas primeiras quadras de Brasília, as 107/108 e 307/308 Sul. As duas primeiras foram traçadas pelo Niemeyer. Caminho por elas e não consigo identificar um único traço que denuncie o seu autor. Tenho uma amiga arquiteta que merecia estar aqui no meu lugar. A 308 foi pensada por Lúcio Costa e o seu projeto paisagístico é do Burle Marx. Penso comigo que é o melhor tipo de paisagem que pode conseguir um morador que não está realmente interessado em paisagem.

Tenho a nítida impressão que se não fossem pelas crianças e pelos cachorros quase ninguém desceria de seus prédios para aproveitar os bonitos e arborizados caminhos que ligam um bloco residencial a outro. Do mesmo modo, parece-me que as muitas quadras de esportes que encontro estão lá apenas para o caso de alguém um dia ter a improvável necessidade de praticar um esporte. Enquanto isso não acontece, são apenas peças decorativas que encarecem o aluguel.

Mas aproveito também para ver a Igrejinha. É uma igreja do tamanho de um grão de mostarda. Erguida a pedido da mulher do JK, antes mesmo de Brasília ficar pronta. Também é obra do Niemeyer, e as paredes externas são um painel do Athos Bulcão. Dentro dela há apenas quatro bancos de cada lado. Mas quinze minutos antes da missa começar, tem início um mutirão para espalhar cadeiras na entrada da igreja. O pessoal tem até mesmo um carrinho, desses de fábrica, para transportar as cadeiras. Em dez minutos aumenta-se a capacidade da igreja para mais cem pessoas. Todas do lado de fora da Igrejinha. Como não estamos na época das chuvas, e o frio nunca é muito acentuado, não há o que temer.

Penso nessas cadeiras, no trabalhão para arrumá-las e depois guardá-las. E admiro a felicidade daqueles que sabem estar fazendo um serviço útil.