O Menino e as Rosas

O menino e as rosas

Quando saio para minhas caminhadas, parar numa rua com amigos, sentar num banco qualquer, eu vejo a figura de um menino, muito loirinho, cabelos encaracolados, olhos verdes, brilhantes, demonstrando uma inteligência privilegiada.

Presto muita atenção no que faz, no que fala e as vezes tenho vontade de conversar com ele. Seu nome é André.

Ele vende rosas. Tem sua clientela feita mas, mesmo assim, entra nos bares, vai para o sinal de trânsito, a fim de vender o seu produto. Fica à porta da Igreja, enfim, ele roda a cidade.

As vezes chego mais perto e escuto o que ele diz:

- " Uma rosa, meu amigo, ou um botão, para levar a quem te deu a vida, tua mãe querida..."

Não há quem resista ao charme do garotinho e à maneira com que fala, com desenvoltura e com a voz muito firme.

Ele almoça por onde está quando lhe dá fome. Um dia, estava comendo e eu me aproximei:

- Oi garoto, que belas rosas tem em mãos. Você vende todas, todos os dias?

- Oi senhor...tudo bem? Não, eu não vendo todas todos os dias. Tem dia que os fregueses estão mal humorados, não me deixam nem falar. Pensam que eu vou pedir esmola, sei lá o que vai naquelas cabeças cheias de ódio.

-Por que ódio, André ?

- Pela maneira com que eles respondem, vejo que estão com raiva da vida, com raiva de tudo, até de mim que acabo de chegar.

-Problemas em casa, com certeza. Briga com a namorada, com a esposa...

- Pois é. Se ao menos um me ouvisse, teria uma boa chance para fazer as pazes, abrir os corações, agradar á quem ofendeu. Eu ofereço a rosa e eles nem percebem que está ali o começo da paz. Quem oferece rosas está querendo agradar a outra pessoa. O senhor não acha?? Eu acho sim André. A natureza nos deu coisas tão lindas e as pessoas, neste corre corre da vida, nem se dão conta do que podemos usufruir dela.

- Péra aí, deixa eu ir lá vender uma rosa para aquele moço que parou ali.

Parece que está esperando por alguém.

E lá foi André correndo a fim de conseguir mais um freguês.

-Oi moço, tá esperando alguém? Compre uma rosa para seu amor, assim, quando ela chegar você terá em mãos um belo presente.

- Não meu pequeno vendedor... eu não estou esperando meu amor. Estou esperando meu pai para irmos almoçar em casa.

- Que bom que o senhor tem pai. Ele é bonzinho?

- Claro que é. Por que, o seu não é?

-Eu não tenho pai. Vendo rosas na rua para ajudar minha mãe. Ela não pode trabalhar e eu sou o filho mais velho. Meu pai morreu faz tempo. Eu queria muito ter um pai para esperar por ele, todas as tardes, na porta do nosso barraco.. Minha mãe é muito boa mas acho que um pai deve ser uma pessoa muito importante na vida da gente...

- É sim...Muito importante. Sabe o que vou fazer? Vou comprar uma rosa sua para dar ao meu pai.

- Oba!!! seu pai vai ficar muito contente moço.

André voltou para acabar de comer. Sua comida já estava fria mas ele não se importava. Seus olhos brilhavam de felicidade por ter vendido mais uma rosa.

- Quanto custa cada rosa André? perguntei

- O amor não tem preço senhor. A pessoa dá o que quiser. A rosa significa o amor que uma pessoa sente pela outra. Quem dá fica muito mais feliz do que quem recebe. O senhor já recebeu uma flor de alguém?

-Hummm!!! Deixe eu pensar...Acho que não. Nunca recebi. Mas sempre ofereço.

- E o senhor não fica feliz em oferecer amor aos outros?

- Sim, fico muito feliz. Todas as vezes que dou flores, meu coração se enche de alegria porque as pessoas também ficam felizes. Você tem razão André, quem oferece fica muito mais feliz.

-Bem...deixa eu ir andando um pouco senão as flores murcham, o pessoal passa e eu não vendo tudo.

E assim começou minha amizade com o vendedor de rosas, o pequenino André, cuja inteligência ultrapassava o limite do que poderíamos esperar de uma pessoa sem estudos, morando numa favela, sem estudar e sem conforto.

Dias, semanas, meses, a gente se encontrava, batia um papinho sempre que possível.

Uma ocasião eu estava parado na esquina, conversando com amigos, e uma ambulância passou, como sempre, voando, para atender alguém. O local não era longe. Fomos todos para ver o que tinha acontecido.

Lá chegando...oh! Deus, que tristeza.. orri para perto. A polícia não queria me deixar passar. Eu empurrei todo mundo Vi esticado no chão, o corpinho franzino, o cabelo loiro e encaracolado, os olhos verdes ainda abertos, o meu querido amiguinho vendedor de rosas. Ao lado, algumas rosas espalhadas, perto de sua mão...

Agachei e senti que André já estava morto. Que emoção meu Deus! Como vou ficar sem o meu amiguinho vendedor de flores?

Antes que alguém colocasse os jornais cobrindo o corpinho de André, eu o beijei e coloquei sobre seu corpo, todas as rosas que restaram, naquela tarde fatídica quando ele foi atropelado e morto pelos animais que dirigem no nosso trânsito louco.. Aquelas rosas demonstravam o meu amor por ele, como ele mesmo me ensinou: "- Dar rosas é dar amor, o senhor não acha?"

Tratei de tudo.. Levei André para casa, depois providenciei o sepultamento.

Os dias passam, vamos vivendo conforme Deus quer.

A saudade é constante. Mas...todos os dias eu converso com meu amiguinho... vendedor de rosas...

Como? Olhando a natureza... Eu vejo André nas nuvens, naquele passarinho que chega quase perto da gente, nas borboletas que as vezes rondam nossa janela., nas frutas que vejo nas árvores e principalmente nas rosas que vejo nos jardins.

Eu o vejo num cãozinho que se enrosca em minha perna e me olha como que pedindo alguma coisa.

Toda natureza me traz André de volta.

Toda semana, vou visitá-lo e levar amor para colocar em cima de sua cova.

Muitos amores, de todas as cores, como ele gostava de vender.

-"Oi moço, vai levar uma rosa para sua querida?"

Parece que ouço esta frase quando vejo um garotinho chegar perto de um carro para esmolar ou vender alguma coisa.

É a força da amizade e do amor que me traz, quase toda hora, o meu loirinho, meu adorado "filho", no plano espiritual do amor, adotado por mim e por todos que sabem da minha história...

N..A.- Não esqueça de oferecer amor à quem você gosta enquanto há tempo.

Jandyra Adami

Jandyra Adami
Enviado por Jandyra Adami em 15/02/2005
Código do texto: T4452