ARTE QUE VEM DAS RUAS.
Há quem diga que somos um país único na arte de improvisar, ou seja, o jeitinho peculiar que só um brasileiro possui.
Neste Brasil, quem nunca falou um repente?
Quem nunca falou de impulso que sente?
Eu, porém quero lhes narrar a façanha de um certo senhor,
Um homem esperto e de simbólico valor.
Desfrutava os raios daquela bela manhã de segunda-feira, “dia mundial da preguiça”, porém todo marasmo se foi quando vi uma multidão, “uma muvuca” como bem diz a Regina Cazé no programa, central da periferia. Era mesmo uma grande concentração popular no centro da praça Célio Miranda de onde ouvi uma voz que dizia:
- Venham ver, é de graça e não vai doer!
Então a curiosidade levou-me bem próximo da muvuca, e logo de cara encontrei o meu amigo Jarlison comprimindo-se no emaranhado de pessoas que buscavam um espaço para contemplar o “tagarela”. Foi aí que percebi os gestos de Jarlison convidando-me à ficar no lugar de uma senhora que estava se retirando naquele momento.
- Você não pode deixar de ver.
- É político?
- Não, é apenas um rapaz fazendo todas as loucuras imagináveis.
- Que tipo de loucura pode prender a atenção de tanta gente em plena segunda feira?
- Confira você mesmo – disse ele.
Naquele aperto olhei por cima de ombros e cabeças que ocupavam o espaço a minha frente, mesmo assim pude contemplar um rapaz que demonstrava ter muitas habilidades, este fazia mágica, malabarismo, e com uma impecável retórica recitava belos repentes.
- Mesmo pulando mais que o saci,
Andei do Iapóqui ao Xuí,
Procurando um lugar.
Só quero me apresentar
Se não for aqui onde será?
Onde será?
- Onde será? - Insistia ele.
Então alguém responde do meio da multidão.
- Não sei!
- Se não sabe vou lhes dizer,
O que tenho aqui
Serve pra mim e pra você,
E quem me ouvir,
Não irá se arrepender.
Enquanto falava o homem “show-mem”, com as mãos ele preparava um cenário, e explicava o que pretendia:
- Com meus trintas e alguns,
Ainda pulo,
Salto e corro,
Já até fui convidado a participar de várias competições importantes,
É sempre completo todo percurso da maratona de São Paulo “São Silvestre”,
Nem todo garanhão de vinte faz isto.
Logo alguém confirma - é mesmo!
Ele era mesmo atlético parecia o “mascara”, foi com uma facilidade incrível que ele saltou de costas e caiu de pé; então surgiu uma voz de admiração:
- Este ai é louco!
- Não sou mesmo, e isso não é nada comparado a isto.
Então, saltou ele por dentro de um aro de bicicleta repleta de facas de mesa.
Perplexa a multidão solta um hóóóóó!
- Fazendo estas cambalhotas por menor das hipóteses eu quebraria a perna ou mesmo o pescoço - comentou meu amigo Jarlison.
O tagarela, maratonista, malabarista nos deixa mais pasmados ainda quando retira um pano enrolado em arame, parecendo um coador de café e começar a falar:
- Quem tem uma nota de dez,
Se não tiverem, a de cem serve.
Para que? - Alguém perguntou.
- Olhem bem, vejam que dentro do pano não tem nada, certo?
- Certo – diz os telespectadores.
- Então alguém ponha uma nota de dez, e eu vou tirar um relógio de pulso.
Os curiosos queriam ver, então alguém de coragem colocou a cédula de dez reais dentro do saco, porque todos queriam saber se o maratonista e malabarista também era mágico:
- Veja só,
Com ajuda da sogra e vovó,
E o dinheiro de Zé bocó.
Terei um relógio pro pulso,
E dez reais no bolso,
Sem nem um esforço.
Com isto todos sorriam, porém o senhor dono do dinheiro estava sério e meio pensante, mas o mágico lhe acalma com as seguintes palavras.
- Não se preocupe, ponha a mão no saco, opa! É no meu e não no seu.
A descontração foi geral, nem parecia ser dez horas, na verdade não tem horas pra sorrir, então o senhor que botara o dinheiro no saco retira do mesmo um relógio muito bonito, porém o dinheiro já não estava lá.
Ele segurava a atenção de todos com malabarismo, mágicas e rimas, no entanto fomos surpreendidos quando uma jovem lhe perguntou:
- O que mais você faz?
- Eu não faço, compro feito e mostro o efeito que vem das garrafadas feita com ervas medicinais, como o manjericão e folhas da alfavaca e a gema do ovo da codorna.
- É verdade?
- Sim, e tenho alguns aqui.
- Você vende? - Pergunta uma mulher
- Sim
- Quanto custa?
- É quase dado, custa somente cinco reais cada.
Ainda tenho o espinafre que acompanha a garrafada, porém ele é um brinde e você não vai pagar por ele, estes dois compõem várias substâncias que irão acabar com a falta de apetite, a indisposição para o trabalho e pra cama. É elas quem sempre reclama que o maridão não esta dando conta do recado, agora elas irão reclamar que ele virou tarado, e você que não guarda nada na memória, esquece até o nome do professor é só tomar duas vezes ao dia e terás uma memória melhor que um disco rígido de um computador.
- Eu quero uma garrafada - disse uma mulher.
- Eu quero duas – disse mais alguém.
Sei que você já deve ter contemplado alguém vendendo garrafadas em algum lugar e até comprado, no entanto, o que comprar de um artista improvisador, mágico e vendedor de garrafadas? Na verdade ele faturou, não sei se vendeu sua arte, porém garrafadas não sobraram.