O Dia do Poeta

Ser poeta

é tirar pedaços da alma sem rasgar a carne,

é arrancar das pedras palavras cruas,

é beijar sua boca como se mordesse a lua.

Há anos tento entender Camões, vivo voando entre os seus versos como uma ave de rapina que desce rente aos penhascos de cada rima como se buscasse algo para comer. Passo horas e horas embrenhado em suas ideias como se ele estivesse ao meu lado guiando as meninas dos meus olhos para cada um dos seus versos. Assim concluo que é preciso ter olhos obedientes e mãos que não guardem apenas os dedos que levam à boca o pão nosso de cada dia. É absolutamente indispensável que degustemos cada sílaba, cada verso, cada palavra, cada lágrima que despenca dos nossos olhos e se espatifam no chão quando sentimos no peito a cor de sua dor.

Camões como tantos outros, não mediu esforços para esculpir sua obra, certamente contou e recontou as sílabas fortes e fracas de cada verso que construiu pelo menos uma dúzia de vezes. Essa tarefa o obrigou a contar também as estrelas caídas no chão de terra batida nos rincões mais estreitos de Portugal.

Quantas vezes tentei ser poeta durante todos esses anos da minha vida... cem? Mil? Que nada! Perdi de mim todas essas contas.

Hoje, neste dia reservado aos escritores dos versos, ainda estou a rimar filosofia com esquizofrenia; ainda estou a me perguntar: será que um dia serei chamado de poeta? Com certeza não! Mas você que é meu amigo e sabe deste meu sonho, por favor, quando eu morrer minta. Diga que fui poeta, mas não esqueça de dizer, para preservar a justiça, que também eu fui um apaixonado por Raquel. Nunca desejei Lia!

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 10/04/2007
Reeditado em 07/10/2017
Código do texto: T444646
Classificação de conteúdo: seguro