Juninho

Em 2003, tive a oportunidade de trabalhar num projeto que tinha como objetivo interceptar crianças e adolescentes, que fatalmente entrariam no crime, e incluí-las na sociedade, através das artes. O projeto, depois de um ano e meio, malogrou por falta de verbas, de material humano e principalmente, pela hipertensão arterial que fui acometida. De qualquer forma, a experiência foi válida... mostrou-me um mundo paralelo, com suas leis, seus códigos, suas misérias.

Dentro da cidade, nas encostas dos morros, nos mangues, existe um outro mundo que só é visto quando um dos seus muitos habitantes, infringe a lei. São crianças e adolescentes que não têm saída, moram em lugares feios, sem saneamento básico, sem escolas e menos ainda, lazer.Muitos não possuem nem mesmo registro de nascimento, ou seja, não existem, não aparecem nas estatísticas... Alguns conseguem driblar o destino mas, a maior parte entra na marginalidade. Foi assim com o Juninho, mulato bonito, tímido, com habilidades manuais e que não se importava de aprender artesanato que aparentemente só interessariam a meninas.Foi o melhor na arte de trabalhar com "fuxico"- para quem não conhece, trabalho feito com pequenos retalhos que juntos formam colchas, bolsas etc.-.Sonhava aprender informática mas o computador que conseguimos estava com problemas e não conseguiu realizar este sonho. Caiu na armadilha do dinheiro fácil cometendo pequenos roubos e o pior, passou a desrespeitar a comunidade.Talvez, tenha se tornado usuário de drogas, não sei, há tempos não o via.

Quarta - feira de cinzas, recebi a noticia do seu assassinato, não se sabe quem ou qual facção o matou.A sua morte será chorada apenas pelos pais e irmãos, não constará nos grandes jornais da mídia, nem será matéria da televisão, e, muito menos será investigada, foi apenas um adolescente, marginal, executado. Para muitos, esta morte será um alivio, para outros, no entanto, é mais um crime brutal cometido pela omissão da sociedade.

Jacy Ferino

23/02/2007