Síndrome de Tourette
Acordei cedo. De péssimo humor, como de costume. Planejei meu dia, tinha muitas coisas para fazer. Tomei um café forte e amargo, como meu dia. Peguei minhas coisas e saí apressada.
O dia fechado só fazia com que meu humor ficasse pior. Parei no ponto de ônibus. Vi uma senhora se aproximando, ela tem cara de quem quer puxar assunto. Pego rapidamente meu fone, não tem nenhuma música tocando, apenas não quero dar brecha para conversas e risadas superficiais. Espero que ela não se sente do meu lado, a viagem é longa.
Escuto gritos. É uma mulher com cara de cansada junto com um garoto. Ele tem aproximadamente uns 10 anos, cabelos pretos e um rosto bonito. É ele quem está gritando. Fala coisas obscenas e tem tiques constantes. A mãe age com naturalidade. Ele tem sua boca machucada, parece tentar segurar a boca para não dizer aquelas coisas. Pobre mãe, tem um filho maluco.
Eles chegam perto, o garoto olha para senhora e a chama de 'velha louca e feia'. A cena é tragicamente engraçada, visto que eu gostaria de dizer o mesmo para ela.
Eu não consigo parar de olhar, e pensar no sofrimento da mãe.
O ônibus chega. Eu espero que a senhora entre primeiro, assim eu me sento bem longe dela. Logo atrás de mim vem a mãe e o garoto. Eles se sentam na fileira ao lado da minha. Tiro meus fones. O garoto continua com seus gritos e tiques. Muitas coisas ruins a respeito dele passam em minha cabeça. Até que o telefone da mãe toca, ela confirma uma consulta com Dr JK. Estava curiosa, procurei sobre ele na internet. Ele é um especialista em Síndrome de Tourette. Nunca tinha ouvido falar. Aproveitei e pesquisei sobre o tema. Ao ler e ver casos, senti uma pontada em meu coração. Aquele garoto tinha plena noção do que ele fazia, ele só não conseguia se controlar. Me senti horrível pelas coisas que pensei sobre ele. Agora tinha mais pena dele do que de sua mãe. Que vida ele tinha. Percebi como minha vida era boa, não tinha motivos para tanto pessimismo. Ao olhar novamente para ele, olhei bem fundo em seus olhos. Vi um garoto lindo e forte. Nesse momento não senti mais pena dele. Pena é um sentimento que só os fracos merecem. Dessa vez eu senti empatia, admiração, coragem. Os gritos e tiques não importavam mais.
Nesse momento eles se levantaram e desceram. Gostaria de ter dito a eles. Gostaria que eles soubessem como fizeram meu dia mais feliz. Espero que um dia eles saibam. Eu vi um livro dentro de sua mochila, se ele gosta de ler, quem sabe ele não leia isso e saiba como fez meu dia e minha vida mais feliz.