Vende-se
Nós somos criaturas de tal modo volúveis
que até acabamos por sentir os sentimentos que fingimos.
Benjamim Constant
que até acabamos por sentir os sentimentos que fingimos.
Benjamim Constant
Vendo sentimentômetro novinho, na caixa.
De acordo com o fabricante, é o aparelho ideal para medir qualquer sentimento, do mais banal ao mais sublime.
Muito útil para calar aquela ex que insiste em dizer que ninguém vai amar você como ela amou.
Prove ao filhos, de uma vez por todas, que você não prefere um ao outro.
Saiba o que vai no coração da sua amada. Mas, cuidado para que ela não use o aparelho em você, pois poderá descobrir que sua adoração pelo XV de Piracicaba é maior do que por ela.
Saiba se seu pai ficou mesmo feliz com as meias que você escolheu para lhe dar neste onze de agosto. E aproveite para se certificar sobre o pegador de panelas que planejava comprar para sua esposa de presente no Natal.
Sempre quis saber se o seu cachorro gosta mesmo de você ou apenas dos deliciosos biscoitos caninos que você dá a ele? Embora eu já saiba a resposta, você ficará mais convencido com uma aferição mais balisada.
Por outro lado, não adianta usar em gatos. Nem mesmo o sentimentômetro poderá revelar o que vai por dentro dessas criaturas insondáveis, descritas por Arthur da Távola como italianos educados na Inglaterra: sentem como italianos e se comportam como lordes ingleses.
Tirando-se esta limitação, é um equipamento sensacional!
Dimensiona todo tipo de sentimentos: amor, ódio, saudades, alegria, tristeza, medo, solidão...
Ganhei numa rifa e confesso que fiquei tentada a experimentá-lo.
Porém, concluí que medir sentimentos é inócuo, se não prejudicial. Arrefece o fogo da paixão, ao esclarecer o que se alimenta de mistério, temperado no ciúme, fruto do pé-de-dúvida.
Tolice sondar almas além do que denunciam os olhares, gestos, palavras e toda a delícia de seu desnudamento.
Os enganos? Fazem parte da maravilha de conviver e aprender.
Arriscar-se pode ser o primeiro passo rumo à chave de um coração.
Ao invés de mensurar as boas emoções, ganho mais ao empenhar-me em vivê-las, forni-las, provocá-las...
Quanto às más... São problema de quem as nutre.
Mas se você não concorda comigo, este é o aparelho!
O preço está ótimo!
Ligue agora! E leve de brinde um incrível orgasmômetro.
Texto publicado na edição de 16/08/2013 no jornal Alô Brasília e reeditado do texto Sentimentômetro, publicado neste Recanto em 29/06/2009.