CONTENDA
Sou o último dos meus. Não haverá mais deles. Olho por olho, bala por bala, sangue por sangue. Nem sei como fui parar ali, mas estou eu, aqui, com a espingarda na mão, pontaria na testa do maldito que matou meu pai, meu irmão.
Tudo começou com João. Briga de bar por causa de rabo de saia, bebida demais, juízo de menos. Um tiro no peito o fez defunto; outro tiro do meu pai começou a contenda.
Nunca fui de dar tiros, sempre carreguei livros embaixo de braço. Se peguei em arma de fogo, foi para espantar onça e cobra que ameaçava meu povo, tentando roubar os anjinhos. Se estou armado é porque não tenho escolha: ou eu mato ou morro.
Por isso troquei as letras pela pólvora quando Fonseca matou meu pai. Meu irmão caçula, Sebastião, matou Messinho, pois errou Fonseca que não errou meu irmão. Bastião morto com um tiro covarde pelas costas; eu escapei por pouco, Fonseca quis matar dois coelhos com uma só bala, sabia que eu era o último e não queria sofrer emboscada.
Na minha terra, só ficou viúva chorando, minha mulher já veste preto. Eu sou um morto vivo, um moribundo, por isso, Fonseca precisa morrer, preciso recuperar meu mundo, meu eixo.
Enfim, crio coragem e atiro, enfio dois tiros no maldito, mas ele não cai. Terei errado o tiro? Atiro uma vez mais e ele não morre, virou invencível. Acerto mais um nas suas costas, dou um tiro bem no seu olho do ouvido e o desgraçado continua vivo. Será o Benedito? Será que minhas balas são de fumaça? Por que não consigo transformar o bandido em finado?
Oque está ocorrendo?
Contenda!
Sou o último dos meus. Não haverá mais deles. Olho por olho, bala por bala, sangue por sangue. Nem sei como fui parar ali...