Eu e ela (que também era eu)
Relendo o conto Uma em duas do livro O silêncio dos amantes, da Lya Luft, lembrei-me de um sonho que tive, não faz muito tempo.
O conto dela começa assim: “Sonhei que corria por um campo, e que fui atingida por um raio que me partiu em duas. Sem medo nem dor, eu era duas - duas mulheres idênticas corriam em direções opostas. No horizonte elas se encontravam, isso eu sabia porque tudo se pode no sonho: sendo uma, eu era duas.”
Já o meu sonho foi o seguinte: Eu estava sentada no sofá da sala assistindo à tevê ao lado de meu marido. De repente, uma mulher, ou seja, eu mesma, vinha do quarto esbravejando. Eu me assustei e me agarrei ao meu marido. Ela, quero dizer, eu, tentava me arrancar dele. Ambas diziam palavras desconexas, mas me lembro que ela, ou seja, eu, dizia: “Saia daí, você tem que sair daí!” E ficamos nessa luta insana durante alguns minutos. Quanto mais ela (eu) me puxava, mais eu (eu mesma) o agarrava, e ele não dizia uma só palavra.
Acordei meio assustada, com uma sensação muito estranha. Eu não sei se ela (eu) queria me tirar dele ou tirá-lo de mim. Durante dias o sonho não me saiu da cabeça. Eu queria tentar entender por que sonhei aquilo. Parecia muito real. E muito louco.
Alguns dias depois, eu conversava com uma amiga e resolvi contar a ela. Ainda estava com aquela sensação esquisita, com aquela imagem nítida de duas de mim brigando por meu marido ou sei lá por quê. Luciana, minha amiga, dando uma de psicóloga, me disse que eu deveria estar vivendo um conflito comigo mesma. Ela achava que eu talvez estivesse descontente com a minha vida no sentido de ser uma pessoa que na realidade eu não sou. “É como se você tivesse duas vidas: aquela que você vive para agradar aos outros e aquela que você gostaria de viver, a que faria você realmente feliz.” – ela disse. E completou: “Você, ou seja, o seu subconsciente estava tentando vir à tona. O seu verdadeiro eu estava querendo assumir o lugar do seu falso eu, esse que você tem vivido.”
Depois de tê-la ouvido em sua teoria freudiana, embora ela não seja especialista no assunto, e esteja mais para intuitiva do que para dedutiva, cheguei à conclusão de que talvez fizessem sentido algumas de suas palavras.
Eu tenho, de fato, vivido de uma maneira mais contida, mais reservada, menos social. Depois que deixei de trabalhar, tenho vivido mais isolada, distante de pessoas de quem gosto muito e que, principalmente, por falta de disponibilidade delas, nos encontramos pouco. Sinto falta dos encontros diários, das conversas, dos programas que fazíamos juntas. Mas, de vez em quando, combinamos alguma coisa. No Dia do Amigo, 20 de julho, me encontrei com três queridas amigas e fomos almoçar juntas e esticamos até o final da tarde. Foi um encontro maravilhoso! Fez um bem enorme pra mim e pra elas também, com certeza.
Quando Luciana me disse que o meu verdadeiro eu estaria querendo retomar o seu lugar, entendi exatamente o que isso queria dizer. Eu sempre fui uma pessoa muito extrovertida, comunicativa e, por vezes, irreverente. Sempre gostei de festas, de sair pra dançar, enfim, minha vida sempre foi sinônimo de diversão. É evidente que nunca deixei de ser responsável com meu trabalho e com minha família, mas também sempre levei o lazer a sério. Mas, como a vida é mesmo imprevisível (ou não), me apaixonei por um homem que é o meu oposto. Com isso, fui deixando muitas coisas de lado para estar bem com ele. Só que, às vezes, esse meu lado festeiro, sociável, divertido, quer emergir. É claro que fico triste, chateada, por não aproveitar a vida do jeito que eu gostaria. Porém, tento me divertir à maneira dele, que é mais contida e limitada, sim, mas que também é interessante.
Minhas amigas mais liberais criticam minha postura. Algumas chegam a insinuar que sou uma idiota, submissa e totalmente fora de moda. Não acho que eu seja nem idiota, nem submissa, muito menos fora de moda. Eu apenas tento zelar pelo meu relacionamento que, apesar de algumas limitações, ainda me dá muito contentamento.
E aí, citando outra autora de quem gosto imensamente, a Martha Medeiros, numa crônica do livro Montanha Russa, em que ela diz: “Um dos maiores fermentos de um relacionamento amoroso é a admiração. É desanimante atravessar os dias sem sentir orgulho da pessoa que está vivendo ao nosso lado. A cada observação perspicaz que ele faz sobre um fato, a cada gesto de solidariedade para com um irmão, a cada bola dentro que ele dá no trabalho, é um alívio pensar: este é o cara que escolhi para estar comigo. Um sujeito legal.”
Portanto, assunto encerrado. Eu o amo, o admiro e não pretendo infringir as regras desse nosso jogo. E juro que não é por medo de perdê-lo, é por medo de me perder. Meu subconsciente alegrinho que trate de se conformar porque os tempos de badalação acabaram. Entre mim (a da realidade) e ela (a do sonho) não há mais compatibilidade. Que cada uma fique em seu canto que é bem melhor. Ela (a do sonho) não há de me tirar o bom humor.
O conto dela começa assim: “Sonhei que corria por um campo, e que fui atingida por um raio que me partiu em duas. Sem medo nem dor, eu era duas - duas mulheres idênticas corriam em direções opostas. No horizonte elas se encontravam, isso eu sabia porque tudo se pode no sonho: sendo uma, eu era duas.”
Já o meu sonho foi o seguinte: Eu estava sentada no sofá da sala assistindo à tevê ao lado de meu marido. De repente, uma mulher, ou seja, eu mesma, vinha do quarto esbravejando. Eu me assustei e me agarrei ao meu marido. Ela, quero dizer, eu, tentava me arrancar dele. Ambas diziam palavras desconexas, mas me lembro que ela, ou seja, eu, dizia: “Saia daí, você tem que sair daí!” E ficamos nessa luta insana durante alguns minutos. Quanto mais ela (eu) me puxava, mais eu (eu mesma) o agarrava, e ele não dizia uma só palavra.
Acordei meio assustada, com uma sensação muito estranha. Eu não sei se ela (eu) queria me tirar dele ou tirá-lo de mim. Durante dias o sonho não me saiu da cabeça. Eu queria tentar entender por que sonhei aquilo. Parecia muito real. E muito louco.
Alguns dias depois, eu conversava com uma amiga e resolvi contar a ela. Ainda estava com aquela sensação esquisita, com aquela imagem nítida de duas de mim brigando por meu marido ou sei lá por quê. Luciana, minha amiga, dando uma de psicóloga, me disse que eu deveria estar vivendo um conflito comigo mesma. Ela achava que eu talvez estivesse descontente com a minha vida no sentido de ser uma pessoa que na realidade eu não sou. “É como se você tivesse duas vidas: aquela que você vive para agradar aos outros e aquela que você gostaria de viver, a que faria você realmente feliz.” – ela disse. E completou: “Você, ou seja, o seu subconsciente estava tentando vir à tona. O seu verdadeiro eu estava querendo assumir o lugar do seu falso eu, esse que você tem vivido.”
Depois de tê-la ouvido em sua teoria freudiana, embora ela não seja especialista no assunto, e esteja mais para intuitiva do que para dedutiva, cheguei à conclusão de que talvez fizessem sentido algumas de suas palavras.
Eu tenho, de fato, vivido de uma maneira mais contida, mais reservada, menos social. Depois que deixei de trabalhar, tenho vivido mais isolada, distante de pessoas de quem gosto muito e que, principalmente, por falta de disponibilidade delas, nos encontramos pouco. Sinto falta dos encontros diários, das conversas, dos programas que fazíamos juntas. Mas, de vez em quando, combinamos alguma coisa. No Dia do Amigo, 20 de julho, me encontrei com três queridas amigas e fomos almoçar juntas e esticamos até o final da tarde. Foi um encontro maravilhoso! Fez um bem enorme pra mim e pra elas também, com certeza.
Quando Luciana me disse que o meu verdadeiro eu estaria querendo retomar o seu lugar, entendi exatamente o que isso queria dizer. Eu sempre fui uma pessoa muito extrovertida, comunicativa e, por vezes, irreverente. Sempre gostei de festas, de sair pra dançar, enfim, minha vida sempre foi sinônimo de diversão. É evidente que nunca deixei de ser responsável com meu trabalho e com minha família, mas também sempre levei o lazer a sério. Mas, como a vida é mesmo imprevisível (ou não), me apaixonei por um homem que é o meu oposto. Com isso, fui deixando muitas coisas de lado para estar bem com ele. Só que, às vezes, esse meu lado festeiro, sociável, divertido, quer emergir. É claro que fico triste, chateada, por não aproveitar a vida do jeito que eu gostaria. Porém, tento me divertir à maneira dele, que é mais contida e limitada, sim, mas que também é interessante.
Minhas amigas mais liberais criticam minha postura. Algumas chegam a insinuar que sou uma idiota, submissa e totalmente fora de moda. Não acho que eu seja nem idiota, nem submissa, muito menos fora de moda. Eu apenas tento zelar pelo meu relacionamento que, apesar de algumas limitações, ainda me dá muito contentamento.
E aí, citando outra autora de quem gosto imensamente, a Martha Medeiros, numa crônica do livro Montanha Russa, em que ela diz: “Um dos maiores fermentos de um relacionamento amoroso é a admiração. É desanimante atravessar os dias sem sentir orgulho da pessoa que está vivendo ao nosso lado. A cada observação perspicaz que ele faz sobre um fato, a cada gesto de solidariedade para com um irmão, a cada bola dentro que ele dá no trabalho, é um alívio pensar: este é o cara que escolhi para estar comigo. Um sujeito legal.”
Portanto, assunto encerrado. Eu o amo, o admiro e não pretendo infringir as regras desse nosso jogo. E juro que não é por medo de perdê-lo, é por medo de me perder. Meu subconsciente alegrinho que trate de se conformar porque os tempos de badalação acabaram. Entre mim (a da realidade) e ela (a do sonho) não há mais compatibilidade. Que cada uma fique em seu canto que é bem melhor. Ela (a do sonho) não há de me tirar o bom humor.