Sobre Cigarros, Café e Casamento

Sentado na varanda eu fumo só o meu cigarro insólito. Penso em tudo e em nada. Encaro uma de suas plantas, que me encara de volta com uma cara de quem não está gostando de ser uma fumante passiva. Você abre a porta da varanda. Pede um cigarro. Encosta na esquina da parede. Dá uma tragada e solta a fumaça pra cima. Você sorri pra mim. Você não resiste e senta no meu colo, de lado, olhando nos meus olhos. Dá mais uma tragada, e eu a acompanho no movimento e dou a última tragada no meu finado cigarro. Ameaço jogar a guimba do cigarro no vaso da sua planta e você me olha feio, retifico meu movimento e repouso a minha guimba no batente da varanda. Retiro-te levemente do meu colo, e vou fazer um café, você gosta da ideia e me acompanha, pega as bitucas dos cigarros para jogar no lixo e entra em casa logo atrás de mim.

Coloco a água pra ferver, e acomodo o filtro de pano em cima do bule. Quatro colheres de pó. A água ainda não dá sinais de que vai entrar em ebulição. Vejo você encostada na pia mexendo no celular e não resisto à ideia de te dar um beijo, você não coloca empecilhos e entra na brincadeira, um longo e suave beijo. A água começa a ferver, aumento o fogo, e você como sempre acha engraçadas as bolhas que a água faz quando ferve. Pego a jarra e transfiro a água para o coador, o aroma de café retira todo cheiro de cigarro da casa e o ar fica mais leve. O café está pronto, pego sua caneca em forma de seio, e a minha do Radiohead, coloco café até um pouco mais da metade de cada uma delas.

Na sala uma surpresa, enquanto eu preparava sua caneca de café, você colocou na agulha um LP dos Los Hermanos que você comprara no dia anterior para me presentear. "Hoje faz cinco anos do nosso primeiro beijo. Eu sei que você não deve se lembrar da data, mas eu quis te presentear com isso, porque há cinco anos eu sou a garota mais feliz do mundo". Você disse isso bem enquanto tocava Ultimo Romance, com isso uma lágrima despencou dos meus olhos, e nisso você riu, pois se lembrou de uma promessa sua no nosso terceiro mês de namoro, quando com uma carta eu te fiz chorar horrores durante dez minutos, e você disse que um dia me faria chorar, e alguns anos depois sua promessa foi cumprida.

Não chorei pelo fato de fazer cinco anos do nosso primeiro beijo, eu chorei por amar você, chorei pelo simples fato de ter as suas mãos nas minhas, chorei porque naquele momento não tive mais duvidas nem sobre o futuro e nem sobre o passado, naquele momento eu vi que eu amava você acima de qualquer suspeita, e que você me amava tanto quanto, ou até mais. Você foi a guria com quem eu decidi dividir todos meus cigarros e minhas manias bestas, como a de ouvir Radiohead em madrugadas frias, e de fumar apenas em dias nublados. Foram as suas manias que eu escolhi. Escolhi aguentar sua TPM, seus gostos por bandas nacionais e sua paixão pelo Ryan Gosling. Foram com seus pés frios e suas mãos quentes que eu resolvi dividir meu sofá, foi com seu sono pesado que eu resolvi dividir a minha insônia, foi no seu abraço que eu resolvi estacionar a minha vida.

Não adianta o mundo ir contra, a Terra girar em um novo sentido, o presidente dos Estados Unidos mandar ou a sua mãe me odiar, não adianta mais nada, a partir de hoje, ao som de Ultimo Romance mais uma vez, eu é que vou te fazer chorar, porque dentro dessa caixa de veludo preta, está o sinal de que eu te quero pela vida inteira, e se possível um pouco mais alem, a partir de hoje eu quero que você leve meu nome junto do seu, e caso você queira, a gente muda e eu levo o seu nome também, a partir de hoje eu quero ser seu, e quero que você seja minha, hoje eu quero saber se você aceita se casar comigo.